quarta-feira, 29 de novembro de 2017

AGROTÓXICOS NO BRASIL


Brasil libera quantidade até 5.000 vezes maior de agrotóxicos do que Europa

Thais Lazzeri
Da Repórter Brasil

Avião joga agrotóxico em plantação
O debate sobre o uso de agrotóxicos ganhou um novo capítulo, e ele não é bom para o Brasil. Estudo inédito revelou o abismo que existe entre a legislação brasileira e a da União Europeia sobre o limite aceitável de resíduos na água e nos alimentos.
A contaminação da água é o que mais chama a atenção, com a lei brasileira permitindo limite 5.000 vezes superior ao máximo que é permitido na água potável da Europa.
No caso do feijão e da soja, a lei brasileira permite, respectivamente, o uso no cultivo de quantidade 400 e 200 vezes superior ao permitido na Europa.
Esses são os resultados do estudo "Geografia do Uso de Agrotóxicos no Brasil e Conexões com a União Europeia", da pesquisadora Larissa Mies Bombardi, do Laboratório de Geografia Agrária da USP (Universidade de São Paulo).
"Infelizmente, ainda não é possível banir os agrotóxicos. Por isso, é importante questionar por que o governo brasileiro não usa parâmetros observados no exterior", afirma Bombardi, para quem a permissividade em relação à água "é uma barbárie".
Enquanto a União Europeia limita a quantidade máxima que pode ser encontrada do herbicida glifosato na água potável em 0,1 miligramas por litro, o Brasil permite até 500 vezes mais. O Brasil tem, segundo o estudo, 504 agrotóxicos de uso permitido. Desses, 30% são proibidos na União Europeia --alguns há mais de uma década.
Esses mesmos itens vetados estão no ranking dos mais vendidos. O acefato, tipo de inseticida usado para plantações de cítricos, é o terceiro da lista.
Uma nota técnica da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária) citada no estudo de Lombardi mostra que o acefato causa a chamada "síndrome intermediária". Entre os danos à saúde estão fraqueza muscular dos pulmões e do pescoço. Em crianças, o risco é mais acentuado. "A nossa legislação é frouxa no que diz respeito aos resíduos e à quantidade permitidos na União Europeia", diz Bombardi.
Para Brian Garvey, da Universidade de Strathclyde, da Escócia, e orientador de Bombardi na pesquisa, as autoridades brasileiras "lavam as mãos da toxidade".
Como resultado, o mapa aponta ainda que oito brasileiros são contaminados por dia, se levarmos em conta os números oficiais, que são subnotificados.
O estudo confirma a informação de que os trabalhadores rurais são as principais vítimas de contaminação, seguidos por quem vive em regiões próximas às plantações, sendo as áreas pulverizadas as mais suscetíveis. No Estado de São Paulo, 75% da área é pulverizada. O último elo da cadeia revela as consequências da contaminação por quem consome. "O agrotóxico não tem público-alvo", afirma Lombardi.
Uma pesquisa da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz) estima que, para cada caso registrado, 50 não o foram. O que significa que, entre 2007 e 2014, mais de 1 milhão de brasileiros foram intoxicados por agrotóxico --um quinto das vítimas é criança ou adolescente.
Para piorar, em 2015, o governo deixou de publicar os casos de intoxicação por agrotóxicos. Desde então, ficou mais difícil estudar os casos de vítimas intoxicados dentro e fora do trabalho, como nos casos de pessoas que moram em áreas pulverizadas.
Bombardi se refere aos casos de intoxicação como a "ponta do iceberg". "A intoxicação representa 2% do total de problemas de saúde que podem acometer a sociedade. As doenças crônicas não são estudadas como deveriam."
Procurada desde sábado (25), a assessoria de imprensa do Ministério da Saúde apenas respondeu que recebeu as dúvidas da reportagem na segunda-feira (27) e que até o final deste dia mandaria esclarecimentos.
A Anvisa, por e-mail, informou que "realiza a avaliação toxicológica dos agrotóxicos, antes de os mesmos serem registrados pelo Ministério da Agricultura" e que há uma série de restrições para registros de agrotóxicos no país, como nos casos que não haja antídoto ou tratamento eficaz no Brasil (leia a íntegra da nota ao final do texto).
Em relação à quantidade de resíduos presentes, a Anvisa afirmou que uma análise feita entre 2013 e 2015 mostrou que quase 99% das amostras de alimentos analisadas "estão livres de resíduos de agrotóxicos que representam risco agudo para a saúde".

Consumo de agrotóxicos aumentou 194% em 15 anos


Desde 2008, o Brasil é o país campeão em uso de agrotóxicos. Consumimos 20% do que é comercializado mundialmente. Não bastasse, o manuseio não parou de crescer. Entre 2000 e 2014, o Brasil saltou de cerca de 170 mil toneladas para 500 mil, aumento de 194% em 15 anos.
Segundo o estudo, nos Estados do Rio Grande do Sul, Paraná, Goiás e Mato Grosso, o consumo do herbicida glifosato fica entre 9 kg e 19 kg por hectare. Análises feitas com animais mostraram que a exposição ao produto causou câncer de mama, necrose de células e reduziu o tempo de vida dos bichos.
Em setembro deste ano, a França anunciou que banirá o glifosato até 2022. "O primeiro-ministro [Edouard Philippe] decidiu que este produto será proibido na França --assim como todos os que se pareçam com ele e que ameaçam a saúde dos franceses", disse o porta-voz Christophe Castaner em entrevista a um canal de televisão.
Mesmo em casos em que o agrotóxico é permitido lá e cá, a quantidade usada é menor, como é hoje o caso do glifosato, o líder brasileiro de vendas. Enquanto na Europa é permitido usar até 2 kg de glifosato por hectare, a média brasileira fica entre 5 kg e 9 kg. Entre 2009 e 2014, o consumo subiu 64%, de 118 mil toneladas para 194 mil. Em 2014, o Mato Grosso liderou as compras, seguido por Paraná e Rio Grande do Sul.
Lombardi aponta ainda que o aumento do uso de agrotóxicos não aumentou a produção de alimentos por hectare no Brasil. O crescimento do consumo do produto aconteceu em paralelo a um outro movimento: o aumento da concentração de terras e da plantação de produtos que usam grandes quantidades de herbicidas.
Em 2003, as fazendas declaradas com área superior a 100 mil hectares ocupavam 2% de todo o território destinado a imóveis rurais no país, em 2015, o número saltou para 18%. Em 13 anos, a área cultivada de soja aumentou 79% no Brasil.
O aumento da produção rural também ajuda a entender esse crescimento no consumo de agrotóxicos. Em 2014, os produtos básicos assumiram a liderança das exportações, com 48% do total. Dos dez produtos mais vendidos pelo Brasil no exterior, sete vêm do campo.
A pesquisadora aponta ainda a política de incentivos às empresas produtoras de agrotóxicos, que têm 60% de desconto no imposto relativo à circulação de mercadorias no Brasil, dentre outros benefícios.

De quem é a culpa?

Embora a lei brasileira seja permissiva, as autoridades tendem a jogar no produtor rural a culpa pelos casos de contaminação. Em audiência pública realizada na Comissão de Defesa do Consumidor da Câmara dos Deputados, em agosto de 2017, tanto o governo quanto a Anvisa atribuíram a contaminação por agrotóxicos à utilização inadequada.
O mesmo argumento foi usado pela coordenadora do Programa Nacional de Controle de Resíduos e Contaminantes do ministério, Rosana Vasconcelos, em reportagem da Agência Câmara: "Quando se depara com o problema de uma praga, de uma doença na sua cultura, ele [produtor] não quer saber se é permitido para o mamão, ele quer saber se mata aquela praga para ele não perder a produção", afirmou.
Na mesma reportagem, o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Mapa) informa que "o uso de agrotóxicos no Brasil está dentro dos padrões internacionais, mas reconheceu que há uma utilização equivocada que pode levar à contaminação". Procurado, o Mapa pediu para enviar os questionamentos à Anvisa.

Leia a íntegra da nota da Anvisa:

"A Anvisa realiza a avaliação toxicológica dos agrotóxicos, antes de os mesmos serem registrados pelo Ministério da Agricultura. No Brasil, é  proibido o registro de agrotóxicos, seus componentes e afins:
- Para os quais no Brasil não se disponha de métodos para desativação de seus componentes, de modo a impedir que os seus resíduos remanescentes provoquem riscos ao meio ambiente e à saúde pública.
- Para os quais não haja antídoto ou tratamento eficaz no Brasil.
- Considerados teratogênicos, que apresentem evidências suficientes nesse sentido, a partir de observações na espécie humana ou de estudos em animais de experimentação.
- Considerados carcinogênicos, que apresentem evidências suficientes nesse sentido, a partir de observações na espécie humana ou de estudos em animais de experimentação.
- Considerados mutagênicos, capazes de induzir mutações observadas em, no mínimo, dois testes, um deles para detectar mutações gênicas, realizado, inclusive, com uso de ativação metabólica, e o outro para detectar mutações cromossômicas.
- Que provoquem distúrbios hormonais, danos ao aparelho reprodutor, de acordo com procedimentos e experiências atualizadas na comunidade científica.
- Que se revelem mais perigosos para o homem do que os testes de laboratório, com animais, tenham podido demonstrar, segundo critérios técnicos e científicos atualizados.
- Cujas características causem danos ao meio ambiente.
No que se refere ao monitoramento dos resíduos de agrotóxicos, favor olhar o link na Anvisa".

Fonte: https://noticias.uol.com.br/meio-ambiente/ultimas-noticias/redacao/2017/11/27/brasil-libera-quantidade-ate-5000-vezes-maior-de-agrotoxicos-do-que-europa.amp.htm

domingo, 12 de novembro de 2017

ARQUEOASTRONOMIA*




A impressionante Astronomia dos índios brasileiros


O físico e astrônomo Germano Bruno Afonso, professor aposentado da Universidade Federal do Paraná, é um dos mais premiados cientistas nacionais. Mestre em Ciências Geodésicas (UFPR), Doutor em Astronomia e Mecânica Celeste pela Universidade de Paris VI, Pós-doutorado em Astronomia pelo Observatório da Côte d`Azur (França), coordenador do curso de Pós-Graduação em Física da UFPR (1984-1990), Prêmio Jabuti de 2000 com o livro didático "O Céu dos Índios Tembé" (2000), Germano é também o único brasileiro especialista em Arqueo-astronomia, uma ciência reltivamente nova no país.
Mesmo com esse currículo invejável, o professor tem sido vítima de preconceito em virtude de sua dedicação ao estudo da Astronomia dos índios brasileiros. Não são poucos aqueles que desconhecem o volume e a complexidade dos conhecimentos que nossos indígenas possuíam, e ainda possuem, acerca do céu. A seguir, uma entrevista com o professor, realizada por Rosana Bond.


A constelação da Ema (Guyra Nuandu) fica na região do céu ocupada pelas constelações ocidentais do Cruzeiro do Sul, da Mosca, do Centauro, do Escorpião, do Triângulo Austral e de Altar. Fonte: http://fisica.ufpr.br/tupi

"...para vermos que o nosso índio, desde a pré-história, já tinha cultura astronômica. Ao contrário do que muita gente diz."



O que é Arqueoastronomia?
É a disciplina que estuda os conhecimentos astronômicos legados pelas culturas dos povos antigos, tais como os mesopotâmios, os egípcios, os gregos, os maias, os incas e os índios brasileiros. Estuda, principalmente, os monumentos líticos orientados para os pontos cardeais e para as direções do nascer e ocaso do Sol, da Lua ou de estrelas brilhantes, passíveis de medições astronômicas, que teriam uma utilidade prática na determinação do calendário e da orientação. Além disso, ela estuda a arte rupestre com possível conotação astronômica.
A observação do céu esteve na base do conhecimento de todas as sociedades antigas, pois elas foram profundamente influenciadas pela confiante precisão do desdobramento cíclico de certos fenômenos celestes, tais como o dia-noite, as fases da Lua e as estações do ano.
O homem pré-histórico logo percebeu que as atividades de pesca, caça, coleta e lavoura obedecem a períodos sazonais. Assim, ele procurou registrar essas flutuações cíclicas e utilizou-as, principalmente, para a sua subsistência.
Como se originou a Arqueoastronomia?
Em 1740, William Stukeley foi o primeiro a estudar Stonehenge, na Inglaterra, do ponto de vista astronômico. Ele percebeu que o eixo principal do monumento estava orientado na direção do nascer-do-sol no solstício do verão. 
A Arqueoastronomia desenvolveu-se com as pesquisas do astrônomo Sir Joseph Norman Lockyer, fundador da conceituada revista britânica Nature. Ele forneceu explicações astronômicas mais detalhadas sobre os megálitos de Stonehenge e os menires (do baixo bretão: men — pedra e hir — longa) da Bretanha (França).
A partir de 1970, a Arqueoastronomia começou a ser ministrada como disciplina em algumas universidades, sobretudo nos Estados Unidos e na Europa. Atualmente, as pesquisas nessa área se intensificam em todo o mundo.
E a Arqueoastronomia no Brasil?
No Brasil, até o momento, lamentavelmente sou o único astrônomo profissional que se dedica ao estudo sistemático da Arqueoastronomia. 
Em 1991, estudamos um monólito (pedra isolada) vertical, com cerca de 1,50 m de altura, encontrado em um sítio arqueológico, às margens do rio Iguaçu, perto de onde foi construída a hidrelétrica de Salto Segredo (PR). Ele tinha quatro faces talhadas artificialmente, apontando para os quatro pontos cardeais. Em volta do monólito havia alinhamentos de rochas menores que, aparentemente, indicavam os pontos cardeais e as direções do nascer e do pôr-do-sol nas estações do ano.
O homem pré-histórico logo percebeu que as atividades de pesca, caça, coleta e lavoura obedecem a períodos sazonais. Assim, ele procurou registrar essas flutuações cíclicas e utilizou-as, principalmente, para sua subsistência
Considerando que esse monólito talhado foi colocado na posição vertical e que muitas tribos brasileiras usavam e ainda usam o relógio solar, supus que o monólito poderia servir, também, como um relógio solar mais aperfeiçoado, pois poderia fornecer os pontos cardeais mesmo na ausência do sol.
Em 1996, durante pesquisas com a arqueóloga Maria Beltrão, encontramos em Central (BA) um monólito semelhante ao de Salto Segredo. Em 2001, na Ponta do Gravatá, Florianópolis, também encontramos um monólito de 1,50 m, com as faces talhadas para os pontos cardeais e rochas orientadas para o nascer e pôr-do-sol nos solstícios e equinócios.
Qual a importância dos achados brasileiros num contexto mundial?
A Ilha de Santa Catarina, por exemplo, é rica em vestígios arqueológicos, sendo a região mais interessante do mundo que conhecemos, do ponto de vista da Arqueoastronomia, em virtude da riqueza de seus megálitos (do grego: mega — grande e lithos — pedras) com orientação astronômica e de suas gravuras rupestres, do fácil acesso e da beleza do lugar. Desde outubro de 2001, estudamos algumas gravuras rupestres e alguns megálitos orientados de Florianópolis, juntamente com o antropólogo Adnir Ramos.
A que se deve essa riqueza de megálitos e gravuras rupestres em Florianópolis?
Nossa hipótese, formulada a partir das orientações astronômicas das rochas e das informações obtidas com índios de diversas regiões do Brasil, é que o local da maioria dos monumentos megalíticos orientados e das gravuras rupestres era utilizado como um centro xamânico relacionado com o sol e com as constelações mitológicas indígenas. É provavelmente o caso de Florianópolis.
Como tem sido suas pesquisas junto aos índios brasileiros?
Trabalho muito com os índios, com Astronomia indígena, principalmente com os conhecimentos dos pajés.
Sou astrônomo profissional, mas trabalho com o conhecimento indígena do céu. Muito daquilo que digo se baseia no modo como os pajés me explicaram a fazer a leitura do céu. Este é o sentido de meu trabalho nos últimos anos, a Arqueoastronomia e a Astronomia dos índios brasileiros.
Nos monólitos que estudamos na usina de Segredo, na Bahia e Santa Catarina duas características nos chamaram a atenção. Primeiro, o fato delas possuírem uma orientação astronômica. Em segundo, sua altura — de 1,50 m a 1,60 m.
Aí, conversando com os pajés, me explicaram os motivos da orientação e da altura. Os índios e os povos antigos não faziam Astronomia só por fazer. Tudo tinha uma razão. Além da parte prática, com finalidade de orientação — os pontos cardeais — havia toda uma parte religiosa, de ritual, de culto aos mortos, de fertilidade etc., que também era ligada à Astronomia. Por exemplo, para os Tupi-Guarani cada um dos pontos cardeais representa o domínio de um deus. O deus maior, que fica em cima da cabeça, é Nhanderu. Os demais quatros deuses, representados pelos pontos cardeais, foram aqueles que o ajudaram a fazer a Terra e todos os seus habitantes. Quanto à altura das pedras, os pajés explicaram que tal medida era para facilitar a mira do índio quanto à posição do nascer ou do pôr-do-sol, para ele se localizar melhor em relação às estações do ano. A pedra serve de mira, então você se afasta um pouco e ela tem que estar na altura dos olhos. E a altura dos olhos do índio era aquela.
Os índios brasileiros também utilizavam constelações para orientação e calendário?
Sim, a constelação do Cruzeiro do Sul, por exemplo, era usada para determinar os pontos cardeais, as horas da noite e as estações do ano. Há muitas gravuras e pinturas rupestres que representam uma cruz, em sítios arqueológicos. Para os índios da família Tupi-Guarani, a constelação do Cruzeiro do Sul tem também um sentido mitológico. 
Fomos muito criticados, até por intelectuais, quando falamos que aqueles monólitos que estudamos tinham ligação com os índios e possuíam objetivos astronômicos. Porque o preconceito dizia que o índio brasileiro, o parananse, catarinense etc. não tinha conhecimento nenhum de Astronomia.
E isso me chocou, porque é sabido que todos os povos antigos faziam a leitura do céu. Se não fizessem não sobreviveriam.
Eles se baseavam num calendário próprio e desse modo sabiam as estações. E, de acordo com o clima, que animal iriam caçar, que fruto iriam colher, que peixe iriam pescar. Tudo isso vinha da leitura do céu. O contrário é que não é verdadeiro.
Como os índios brasileiros marcavam o mês e o ano?
O primeiro dia do mês era quando aparecia, do lado oeste, logo após o pôr-do-sol, o primeiro filete da Lua, depois do dia da Lua Nova, quando a Lua não é visível. O ano iniciava quando as Plêiades, conhecida como As Sete Estrelas, apareciam pela primeira vez, do lado leste, logo antes do nascer-do-sol, perto do dia 11 de junho, depois de cerca de um mês sem serem vistas. O conhecimento astronômico dos nossos índios aparece em inúmeras gravações rupestres no Paraná e Santa Catarina. Encontramos a representação de um cometa numa pedra aqui no Paraná. Se você mostrar para qualquer criança ela vai falar que é um cometa. Tem o núcleo, a cabeleira, a cauda. O desenho é perfeito. Inclusive a cauda não é reta. E por que?
Quando é a cauda de um cometa velho, ele só tem gás, então a cauda é reta devido ao vento solar. Mas quando o cometa é jovem, grande e brilhante ele solta "poeira" e a cauda é curva. Então se deduz que foi um cometa grande e brilhante que os índios desenhistas viram e representaram.
Localizamos também uma rocha que tem nada menos que 250 desenhos relacionados com o céu. Só para vermos que o nosso índio, desde a pré-história, já tinha cultura astronômica. Ao contrário do que muita gente diz.
É verdade que o sr. descobriu uma rosa dos ventos dos guaranis no Paraná?
Os Guarani têm uma rosa-dos-ventos. Uma informação que li sobre a gênese guarani era de que no céu existiam palmeiras azuis representando os quatro deuses (os quatro pontos cardeais: norte, sul, leste, oeste) e suas quatro esposas (os pontos colaterais: nordeste, noroeste, sudeste, sudoeste) formando uma rosa-dos-ventos.
Os Guarani dizem que tudo o que existe no Céu existe também na Terra. Porque a Terra nada mais é do que um reflexo do Céu. Aí começamos a procurar algum vestígio concreto disso. Até que um dia no Paraná, em Itapejara D’Oeste, na beira do rio Chopim, encontramos essa rosa-dos-ventos! Encontramos um círculo de palmeiras. Colocamos o teodolito no meio do círculo e medimos as direções dessas palmeiras. O resultado é que deu exatamente os pontos cardeais e os pontos colaterais. Uma rosa dos ventos de palmeiras aqui na Terra!
Curioso notar que a palavra Itapejara não significa nada em guarani. No entanto, originalmente essa região se chamava Tapejara, que significa o Caminho do Senhor. E certamente uma rosa-dos-ventos é um excelente guia.
Por que o sr. tem percorrido escolas da região sul ensinando Astronomia indígena?
As constelações dos índios são bastante fáceis de observar. Notei algo curioso. As constelações da Astronomia ocidental, as que constam em nossos livros, geralmente as pessoas leigas não conseguem ver.
Eu , como astrônomo, sei obviamente onde estão todas as principais estrelas de uma determinada constelação, mas consigo imaginar com dificuldade um Leão naquele tal lugar ou dois Peixes em outro lugar. Agora pensem numa criança, ou numa pessoa leiga no assunto, elas olham o céu e ficam decepcionadas.
Com as constelações indígenas isso não acontece. Não precisa forçar a imaginação, você olha e enxerga. Por que? Porque os índios não juntavam simplesmente as estrelas. Juntavam as estrelas brilhantes e formavam as figuras com as manchas claras e escuras da Via Láctea. Além disso, eles vêem mesmo determinado animal no céu. Como aquela brincadeira que a gente faz com as crianças, de enxergar desenhos nas nuvens.
Para o ensino da Astronomia às crianças, as constelações indígenas são um auxiliar precioso. Quando elas aprendem as constelações indígenas — da Anta, do Veado, da Ema, da Cobra, da Canoa etc. — depois a ocidental fica mais fácil de ensinar. Primeiro você mostra a indígena e depois a ocidental. Assim ela não se decepciona e se sente incentivada a visualizar a outra.
Outra coisa interessante: você sabia que o mito do Saci Pererê, que muita gente pensa ser africano, é o Jacy Jaterê dos índios brasileiros? Significa "fragmento de Lua". A origem do Saci Pererê é a mitologia indígena e tem ligação com a Astronomia.

Fonte: http://anovademocracia.com.br/no-18/835-a-impressionante-astronomia-dos-indios-brasileiros
* Título editado



sexta-feira, 3 de novembro de 2017

(DES)EDUCAÇÃO*



Diretor e professora são afastados após polêmica com exposição em escola no Paraná





O diretor e uma professora do Colégio Estadual Dom Geraldo Fernandes, no município de Cambé, no norte do Paraná, foram afastados do cargo devido a uma exposição de arte que gerou polêmica.
Segundo a Secretaria da Educação do Paraná (Seed) o afastamento tem o prazo 30 dias e e após o período estabelecido será realizada uma sindicância para novas definições.
A mostra abordou temas como aborto, suicídio, abuso sexual e intolerância religiosa. A Polícia Civil abriu um inquérito para investigar o caso, após uma denúncia do pai de um dos alunos.  A polícia investiga se o conteúdo aplicado pelos educadores tem algum tipo de apologia.
A exposição ficou em um espaço da escola aberto para o público. De acordo com o colégio, a exposição foi desenvolvida por alunos do 3º ano do ensino médio com base na matriz curricular. Os temas foram escolhidos pelos próprios alunos.
“Cabe lembrar que os assuntos não foram escolhidos de forma aleatória, mas representam problemas cotidianos enfrentados pela comunidade escolar, que lida diariamente com episódios como automutilação de alunos, gestação na adolescência, casos de abortos relatados pelas alunas, discentes com tendências suicidas, relatos de assédio e abuso sofridos pelos menores em ambientes diversos”, afirma nota divulgada.
Por meio de nota, a App-Sindicato, que representa os professores se posicionou contra os afastamentos. “Tal atitude não tem amparo legal para tal afastamento, que se baseia pura e simplesmente em vídeo e denúncia divulgada nas redes sociais realizada de maneira equivocada e fora do contexto da vida escolar”, afirma.
O tema foi levado para discussão a Assembleia Legislativa do Paraná, pelo deputado Tiago Amaral (PSB).











Veja a nota do sindicato na íntegra:
A direção estadual da APP-Sindicato vem a público repudiar a atitude autoritária e precipitada da secretária de educação do Paraná, senhora Ana Seres Trento Comin, de afastar os servidores Sidinei Marcelino dos Santos e Fabricia Fernanda Donofri, educadores(as) que atuam no Colégio Estadual Dom Geraldo Fernandes, na cidade de Cambé.
Tal atitude não tem amparo legal para tal afastamento, que se baseia pura e simplesmente em vídeo e denúncia divulgada nas redes sociais realizada de maneira equivocada e fora do contexto da vida escolar.
O sindicato acompanha o caso e se coloca a disposição destes e de todos(as) os(as) professores(as) e funcionários(as) que se sentirem prejudicados por qualquer medida que vise a punição sem as devidas investigações e averiguações necessárias. Não admitiremos o linchamento público daqueles(as) que trabalham diária e incansavelmente por uma educação pública de qualidade para a população paranaense.
Com a mesma preocupação, o sindicato tem denunciado os constantes ataques do governo à categoria que vão desde a retirada de direitos, perseguições a educadores(as) nas escolas públicas do Paraná até a punição por afastamentos legais. Não nos calaremos!
As famílias tem um papel fundamental no acompanhamento da vida escolar das nossas crianças e jovens e o sindicato sempre defendeu e defenderá a participação destes atores nas instâncias democráticas das nossas escolas como o Conselho Escolar, por exemplo. Contamos com vocês para juntos lutarmos pela escola pública.
Sendo assim, reafirmamos nosso compromisso incansável de defesa dos direitos dos(as) professores(as) e funcionários(as), assim como da educação pública de qualidade para todos e todas.
Direção estadual da APP-Sindicato

Veja a nota da escola na íntegra:

Vimos através desta esclarecer à sociedade sobre os recentes acontecimentos envolvendo nossa comunidade e o desenvolvimento do processo ensino aprendizagem em nosso colégio.
Na última semana do mês de outubro, mais especificamente no dia 26/10, os alunos do Colégio Dom Geraldo Fernandes realizaram a montagem de uma instalação nas dependências do colégio, baseada nas reflexões feitas em sala a partir do conteúdo estabelecido pelas Diretrizes Curriculares da Educação Básica.
Por uma interpretação equivocada do trabalho, a postagem de um vídeo e fotografias sobre a instalação vincularam na internet gerando interpretações das mais variadas possíveis.
As acusações, críticas, desabafos e insultos que estamos sofrendo geraram a necessidade de um esclarecimento mais aprofundado sobre o que realmente aconteceu na escola com vistas a tranquilizar pais, alunos e comunidade.
Esclarecemos que os trabalhos foram realizados pelos alunos do 3º ano do ensino médio dentro da matéria de artes no tópico- arte conceitual que aborda temas atuais, fazendo com que o expectador possa refletir sobre eles. 
O conceito de arte que se quer representar nesse contexto é mais reflexivo do que estético ou sensorial. Durante as aulas, a docente procurou apresentar a proposta dessa corrente artística, pedindo aos discentes que escolhessem temas que lhes incomodassem em seu cotidiano, promovendo a reflexão filosófica, histórica, sociológica e a mediação didática sobre eles.
Os temas escolhidos pelos estudantes foram: a pedofilia, o suicídio e o aborto dentre outros. Após a seleção dos assuntos a serem tratados, a turma realizou pesquisas e debates pertinentes, com posterior montagem da instalação que representava a síntese de todo o processo realizado. A linguagem utilizada estava adequada para a idade/série envolvida, sendo que, a partir da exposição deste trabalho, pretendia-se que houvesse um desdobramento da temática, com adaptações para cada faixa etária, uma vez que a docente atua em todas as turmas do ensino regular.
Cabe lembrar que os assuntos não foram escolhidos de forma aleatória, mas representam problemas cotidianos enfrentados pela comunidade escolar, que lida diariamente com episódios como automutilação de alunos, gestação na adolescência, casos de abortos relatados pelas alunas, discentes com tendências suicidas, relatos de assédio e abuso sofridos pelos menores em ambientes diversos.
Dessa forma, evidencia-se que a intenção da escola era prover o corpo discente de instrumentos para lidar com essas situações.
A pertinência dos temas debatidos justifica-se pelos alarmantes dados do Ministério da Saúde que aponta um aumento de 12% dos casos de suicídio no Brasil, na faixa dos 15 aos 29 anos, sendo a quarta maior causa de morte entre jovens e que 66,1% dos casos ocorrem por meio do enforcamento. 
Como forma de combate, no ano de 2003, a Associação Internacional para a Prevenção do Suicídio e a Organização Mundial da Saúde criaramo mês de prevenção ao suicídio, relembrado em setembro, pois, segundo a OMS, todos os anos morrem cerca de um milhão de pessoas por esta causa. 
O trabalho também foi influenciado pelo slogan da campanha do setembro amarelo “Falar é a melhor solução”.
O tema do aborto, também foi trabalhado principalmente porque segundo a OMS, a cada dois dias uma mulher morre no Brasil em decorrência de abortos clandestinos, sendo as maiores vítimas mulheres pobres, negras e moradoras das áreas de periferia, sendo este justamente o público atendido pelo Colégio. 
Neste trabalho, ao contrário do que vem se espalhando pelas redes sociais, não existe incentivo algum e sim evidenciar de que é proibido por lei, da agressividade e risco de vida que representa às gestantes.
Destaque-se que a comunidade escolar busca trabalhar firmemente a ideia da prevenção da gravidez, orientando sempre a busca de profissionais especializados para orientá-las, evitando que nossas alunas cheguem a esse ponto extremo.
Sobre o específico trabalho que abordou a pedofilia os estudantes tentaram expressar por objetos de forma visual que muitos dos casos foram reconhecidos pela igreja levando o Papa Francisco no ano de 2014 a pedir perdão formal às vítimas de pedofilia praticada por muitos sacerdotes contra fiéis, reconhecendo o problema e a necessidade do debate e de investigações sobre os casos, para que haja solução para esta chaga social. 
Ao abordar o tema, o colégio e os alunos não tiveram intenção de tornar as instituições religiosas em um alvo para discriminação, mas discutir um problema social do qual nossas crianças não estão seguras.
Por todas estas razões, nosso pronunciamento tem como objetivo prestar esclarecimentos à sociedade, mediante toda a repercussão negativa promovida por pessoas estranhas à comunidade escolar, que contribuíram para a exposição dos alunos envolvidos e o julgamento moral da professora por indivíduos não qualificados profissional ou hierarquicamente para julgar o fazer docente.
Como dito a mostra do trabalho dos alunos abordou temas atuais e polêmicos e não teve intenção alguma de induzir, incentivar, fazer apologia e nem de desrespeitar nenhuma religião.
A comunidade toda pode continuar confiando em nosso trabalho porque jamais realizaremos qualquer atividade que não tenha o objetivo acadêmico.
Não somos criminosos nem ativistas!
Somos professores com muito orgulho!

Fonte: http://paranaportal.uol.com.br/cidades/exposicao-em-escola/?utm_source=facebook.com&utm_medium=social&utm_campaign=fb-noticias&utm_content=geral

PSIQUIATRIA*


NORUEGA IMPLEMENTA EL PRIMER HOSPITAL PSIQUIÁTRICO LIBRE DE MEDICAMENTOS





Quienes tengan una idea sobre la salud mental, probablemente no conciban la existencia de ésta sin medicamentos. En la sociedad contemporánea, prácticamente todas las “enfermedades” mentales son susceptibles de tratarse mediante fármacos, sin importar cuál sea su grado ni mucho menos cuáles sean sus particularidades con respecto a la historia de vida del paciente. 
Como resultado de una forma de entender los conceptos de salud, paciente, medicina y bienestar, entre otros, se cree que todos los seres humanos pueden ser tratados de la misma manera, y que, por ejemplo, una depresión es idéntica en una mujer de 50 años que en un adolescente de 16, en un hombre que perdió a su esposa o en una joven que no puede dormir por las noches. Y bajo esa premisa, a todos se les ofrece la misma solución: un fármaco cuya promesa es devolverlos a la normalidad, lo que sea que esto signifique. Asimismo, este entendimiento de la salud mental es tan dominante que pensar en otras alternativas suele ser considerado un exabrupto, un pensamiento descabellado o una charlatanería. 
Recientemente, sin embargo, en Noruega se está impulsando un proyecto que busca demostrar la factibilidad de la alternativa, esto es, que es posible desprender la salud mental y psiquiátrica del enfoque farmacológico que la ha dominado en los últimos 50 años.
En la remota ciudad de Tromsø, en el norte de la península escandinava, se encuentra el Hospital Psiquiátrico de Åsgård, que desde la entrada anuncia su particularidad: “medikamentfritt behandlingstilbud”, “tratamiento libre de medicamentos”, consigna impulsada por el propio ministerio de salud del país y que, entre otros propósitos, busca explorar otras formas de tratar la mente y sus trastornos.




¿En qué consiste la alternativa? Dicho con brevedad y simpleza: en escuchar al paciente. Merete Astrup, directora de la institución, describe así la especificidad de esta perspectiva:
Es una nueva forma de pensar. Antes, cuando las personas buscaban ayuda, se les daba siempre a partir de las necesidades de los hospitales, no de aquello que los pacientes querían. Estábamos habituados a decir a los pacientes: “Esto es lo mejor para ti”. Pero ahora les decimos: “¿Qué quieres en realidad?”. Y ellos pueden decir: “Soy libre. Puedo decidir”.
Asimismo, Magnus Hald, jefe de los servicios psiquiátricos del Hospital Universitario del Norte de Noruega, añade:
Tenemos que considerar que la perspectiva del paciente es tan valiosa como la del médico. Si los pacientes dicen que esto es lo que quieren, por mí está bien. Se trata de ayudar a las personas a que sigan adelante con sus vidas, de la mejor forma posible, y nosotros deberíamos ayudar a las personas a seguir, tomando medicamentos si es lo que quieren, y respaldarlos si quieren intentarlo sin medicamentos. Deberíamos hacer eso posible.
Estos dos testimonios expresan con sencillez el principal problema de la psiquiatría moderna: el lugar secundario al que relegó la historia no del paciente, sino de la persona. 
Por más que el enfoque cientificista parezca inapelable, lo cierto es que en lo que respecta a la mente, sus “enfermedades” no son el resultado exclusivo de desequilibrios neuroquímicos. La locura, la depresión, la ansiedad y otros trastornos son usualmente síntomas en los que se condensan circunstancias de nuestra vida que no entendemos o aún no hemos explorado. Dicho de otro modo: no hay dos personas en el mundo que estén tristes por la misma razón. No obstante, desde un enfoque moderno de la mente humana, en vez de intentar entender esas razones, a ambos individuos se les ofrece la misma solución: un antidepresivo.
Por el momento no es posible saber hasta dónde llegará este proyecto puesto en marcha en Noruega. Sin embargo, el solo gesto de escuchar al paciente psiquiátrico es, para los médicos que los tratan, un gran paso cuya dirección podría ser quizá un entendimiento de la salud y el bienestar como estados que manan directamente de la subjetividad y las circunstancias personales.

Veja mais em https://www.madinamerica.com/2017/03/the-door-to-a-revolution-in-psychiatry-cracks-open/
http://madinbrasil.org/2017/04/as-rachaduras-na-porta-para-uma-revolucao-na-psiquiatria/

*Título editado

Fonte: http://pijamasurf.com/2017/10/noruega_implementa_el_primer_hospital_psiquiatrico_libre_de_medicamentos/#.WfiiZdmY8mA.twitter


Colaboração: Sérgio Fregolão