A
votação
Walmir Assunção*
A
votação é secreta, a família que não é. O homem é tão vergonhoso que os
desavergonhados só fizeram o concluio com a ajuda da lei: às escondidas.
Refiro-me a seus amigos deputados. No entanto a família toda ficou na torcida,
em júbilo no plenário diabólico: esposa, filhos e sobrinhos. Todos precisavam
dar apoio ao pai ou titio bom provedor. Para que se esconder? Foi decidido pela
Câmara que papai ainda é um deputado.
Mas
por que não se esconder? Se titio é o pior tipo de presidiário. Donadon está
preso, reclamou bastante do banho frio. Só faltou ir de regata para mostrar bem
as marcas das algemas. Disse que é tratado como preso comum na Papuda, o que é
lamentável, pois Donadon não é preso comum e deve ser muito maltratado.
Declarou-se
inocente, o que é um tanto descabido. Garantiu ser evangélico, no que todos nós
acreditamos. Ajoelhou-se e rezou após o veredito. Foi decretado que Donadon se
manterá um parlamentar. Sua mão decerto é bem pesada. Deputado preso no Brasil,
só se for muito desajeitado.
A Câmara se personificou na sombra dos votos, tudo para inocentá-lo. Foi preso no exercício da sua
função, todos compreenderam. Numa votação secreta sabemos que a dignidade é um
detalhe, como em alguns indivíduos. É um bastão que passa de mão em mão sem
pouso, sem acusar as mãos vazias dessa dignidade. O veredito será sempre hediondo e sem culpados
pelo veredito.
Enquanto alguns cumprimentavam o Deputado por
códigos, com as sobrancelhas em nossas barbas, a família ficou eufórica na
torcida. A filha chegou a pedir para o pai não ir ao plenário, pois talvez
fosse mesmo vergonhoso – como se não pudéssemos lhe perguntar sobre o
vice-versa. Será que a filha nunca
vestiu uma meia do pai? A família se nega a sair do apartamento na Asa Norte de
Brasília. Afinal, para que ter vergonha? Se o pai é bom provedor, vai até o sobrinho.
*Walmir Assunção é cronista, contista e escritor em Curitiba/PR.
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