segunda-feira, 31 de agosto de 2015

HORTAS COMUNITÁRIAS




Hortas Urbanas Comunitárias em plena São Paulo: resgate de espaços de cultivo e partilha de relações!


Quando falamos em horta geralmente vem em nossa mente a imagem de um lugar afastado no interior, porém para mim esta imagem foi modificada depois que descobri que dentro de uma das maiores cidades do mundo pessoas se unem para plantar e trocar experiências.

Carros, praças e até o canteiro central de avenida é utilizado para se plantar



Viver numa cidade como São Paulo e buscar manter um certo equilíbrio e qualidade de vida não é tarefa fácil, mas as vezes as soluções são tão simples que nos surpreendem.
O ato de cultivar a terra, plantar sementes e compartilhar os cuidados e seus frutos é ancestral. Sem o alimento e a união entre as pessoas a humanidade não resistiria.
O contato com a terra, a água, o Sol, as sementes, o acompanhar do crescimento de seus frutos, dividir os cuidados e compartilhar sua produção são atividades que trazem bem-estar e união entre as pessoas, além disto comer o que você cultivou tem outro sabor!
Para minha surpresa, ao caminhar pela Avenida Paulista, símbolo de negócios da cidade, vejo na Praça dos Ciclistas, uma pequena horta, com ervas aromáticas. Algo simples e inusitado, mas com grande repercussão em mim. Pareceu que o tempo parou e o contexto da correria e trânsito cotidianos ficaram suspensos... De repente a velha divisão campo x cidade foi rompida!

A Horta do Ciclista fica em plena Avenida Paulista, uma das mais impotantes do Brasil

A Horta do Ciclista fica em plena Avenida Paulista, uma das mais impotantes do Brasil
A Horta do Ciclista fica em plena Avenida Paulista, uma das mais impotantes do Brasil


Como pode uma pequena área verde no meio do asfalto e arranha-céus, em que pessoas em geral passam uma pelas outras sem se olharem, algumas sementes serem plantadas pela união de gente por um ideal?
Depois desta experiência, que deixou meus olhos mais apurados, comecei a perceber coisas que antes a correria desenfreada da cidade escondia de mim. Acabei encontrando a horta comunitária na Praça das Corujas, próxima da Vila Madalena. Um espaço organizado onde as pessoas se dividem nos cuidados de uma horta comunitária. O local é aberto a todos que queiram contribuir e colher com bom-senso. E o interessante é que a horta não é destruída, ela é de todos e todos cuidam dela.

Horta das Corujas na Vila Beatriz

Detalhe de um pé de boldo, cultivado na Horta das Corujas
Detalhe de um pé de hortelã, cultivado na Horta das Corujas
Detalhe de uma berinjela, cultivada na Horta das Corujas
Um pequeno abacaxi, cultivado na Horta das Corujas
Detalhe de uma folha de couve da Horta das Corujas
Os pássaros são bem vindos na horta
Visão geral da Horta das Corujas e da Praça das Corujas


Experiências como estas nos deixam perplexos, já que todos os dias somos bombardeados com notícias de corrupção, atos destrutivos, egoismo extremo, violência e muito pouco amor para com o próximo.
E engana-se que pensa que para criar uma horta urbana é necessário um terreno. Subindo pela Rua Dr. Homem de Melo, em Perdizes, me deparei com um carro velho que virou uma horta estacionada na própria rua. O que era uma sucata deu lugar a várias ervas e plantas variadas e ficou lindo.

Horta urbana feita dentro de um carro abandonado em Perdizes
Horta urbana feita dentro de um carro abandonado em Perdizes

Estas hortas são espaços onde se pode respirar, não por causa das plantas purificarem o ar, mas sim por ser um local onde é possível o encontro entre as pessoas, o partilhar do cuidado e o compartilhar de seus frutos, bem como troca de conhecimento e ensino para as crianças sobre os cuidados com a terra, valorizando o contato com a natureza e com os outros. O espaço não é de ninguém, em geral são públicos, e por isso mesmo tratado com respeito por todos. Os ideais de sustentabilidade, de cultivo orgânico são vivenciados na prática o que mostra que é possível convivermos com a natureza e com os outros de outra forma, ao contrário das notícias que são repetidas todos os dias.

As hortas comunitárias resgatam o contato com a natureza e ampliam as redes sociais e solidárias, resultando em saúde mental e harmonia consigo, com os outros e com o ambiente. São em si mesmas revolucionárias, pois são contrapontos às verdades cotidianas das grandes cidades.

Um projeto que apesar de não ser considerado uma horta comunitária, mas que é um exemplo muito interessante por parte da iniciativa privada é a horta urbana do Shopping Eldorado, na zona oeste de São Paulo. Para resolver o problema do lixo orgânico gerado pelos restaurantes da praça de alimentação o superintendente do Shopping, Sergio Nagai, resolveu efetuar a compostagem do lixo e acabou por criar uma horta urbana no teto do shopping. Toda a produção é destinada aos próprios funcionários do Shopping.




Exemplos pelo mundo

São inúmeras as experiências com hortas comunitárias ou hortas urbanas e jardins comunitários pelo mundo.
Um exemplo bem interessante é este jardim criado no teto de um ônibus na Catalunha, Espanha.







Em Portugal a idéia começa a espalhar-se também. Em Lisboa um projeto pretende criar 130 hortas urbanas que fornecerão alimento a preços muito abaixo dos praticados no comércio.
Em Nova York hortas urbanas estão crescendo nos telhados dos edifícios no bairro do Brooklin. A empresa Bright Farms planta perto de supermercados, o que ajuda a encurtar o caminho entre a comida e os pontos de venda.


Uma cidade localizada no norte da Inglaterra chamada Todmorden criou o projeto “A incrível Todmorden comestível”. Este projeto utiliza toda a área pública do município para fazer plantações comunitárias onde qualquer morador da cidade pode colher alimentos gratuitamente. A cidade incentiva também as pessoas a ajudar no plantio e as crianças estão aprendendo desde cedo a importância do cultivo e da terra. São aproximadamente 40 hortas esplanadas pela pequena cidade de 17 mil habitantes. Todos os lugares disponíveis são utilizados para plantar.
Além das plantações outro projeto na mesma cidade tem como objetivo a criação de galinhas.

Horta urbana na cidade inglesa de Todmorden: Créditos da imagem Incredible Edible Todmorden







Conclusão

Ao contrário do que possamos imaginar é possível sim plantar e colher nossos próprios alimentos nas grandes metrópoles. Além do benefício ambiental e social podemos também resgatar prazeres há muito esquecidos ou que nunca tivemos a oportunidade de experimentar.
Os verdadeiros prazeres não são caros... ser bem recebida na horta, sentir os diversos e surpreendentes aromas das ervas, trocar experiências e conhecimentos... reconhecer no sorriso de quem planta a felicidade da partilha!

Referência(s)

Fonte: http://www.sermelhor.com.br/ecologia/hortas-urbanas-comunitarias-em-plena-sao-paulo.html


Hortas comunitárias se popularizam cada vez mais em Berlim



Seja no telhado de um shopping, seja em um antigo aeroporto, as hortas estão se espalhando por Berlim. Cada vez mais, moradores trabalham a terra para cultivar tomates, batatas e... vínculos sociais, em uma cidade onde ainda parece haver espaço para tudo.

Alguns agriões esmirrados resistem bravamente às chuvas e aos fortes ventos que varrem as pistas de aterrissagem de um aeroporto fechado em outubro de 2008 e transformado em um amplo parque para os berlinenses.

Quando chega o bom tempo, pepinos, aipos e manjericão crescem à sombra dos girassóis nesse jardim comunitário. Recentemente, uma colmeia instalada no meio dos pequenos lotes começou a produzir o primeiro mel a levar o selo do antigo aeroporto de Tempelhof.

De dia, carrinhos de mão e mangueiras são usados a todo vapor nas matas de ervas aromáticas. Ao anoitecer, amigos brindam com cerveja para celebrar o espírito coletivo e a amizade.

"Allmende Kontor" e o vizinho "Rübezahl Garten" são duas das inúmeras hortas que cresceram como grama na capital alemã. No bairro popular de Wedding, uma associação planeja instalar cultivos de cenouras e morangos no telhado de um supermercado local.

"Trata-se de cultivar hortaliças e também de participar de um projeto coletivo, de fazer coisas juntos. É um lugar onde todo mundo participa", explica Burkhard Schaffitzel, um dos iniciadores do "Rübezahl Garten".

"As pessoas vêm de todos os horizontes, de imigrantes turcos a estudantes, passando por aposentados", conta Gerda Münnich, uma entusiasta da "Allmende Kontor".

Esse é exatamente o segredo do sucesso. Sua horta já conta com cerca de 300 "arrendatários" e tem uma lista de espera de mais de 200 pessoas. Os responsáveis pelo jardim pagam 5.000 euros por ano à Prefeitura para utilizar seu pedaço de terra e fazem apelos por doações para manterem a iniciativa.

Legumes e verduras crescem em baldes e caixas de madeira, porque a Prefeitura não permite as plantações diretamente no solo no antigo aeroporto. Alguns optaram pela originalidade. Sapatos usados, mochilas, ou até uma velha cadeira de escritório: vale tudo para garantir seu espaço na horta.

Horta, um lugar de socialização A escolha pela jardinagem cria um estilo de vida e, ao redor dela, surgem "pequenos lugares". O mecânico de bicicletas "Ismael" oferece seus serviços em um reboque velho e amassado, instalado no terreno, enquanto uma "praça do povo", no centro do jardim, permite que a comunidade possa assar salsichas quando o grupo organiza festas.

"A horta não é apenas um lugar dedicado a uma atividade de auto-subsistência, mas um lugar de socialização", explica a socióloga alemã Christa Müller, que escreveu um livro sobre o "urban gardening".

O fenômeno é internacional. Desde seu início nos bairros pobres de Nova York, já foram criadas hortas comunitárias em Paris, Montreal e outras cidades. Na capital alemã, houve um empurrão muito particular: a reunificação da cidade, após a queda do Muro no final de 1989, que dividiu Berlim por 28 anos. A mudança deixou uma grande quantidade de espaços vazios e abandonados.

"Londres e Paris estão saturadas. Aqui ainda temos lugar para plantar verduras", comemora Schaffitzel.

Para muitos, criar uma horta coletiva também é uma iniciativa cidadã. "Fazemos política no meio das alfaces", brinca Gerda Münnich, que, depois de passar sua carreira diante das telas dos computadores, decidiu se dedicar às abóboras e aos repolhos.

"É se apropriar um pouco da cidade. É participar da decisão coletiva. Esse pequeno terreno que eu cultivo é um pedacinho da cidade que me pertence", diz ela, com orgulho.

Para a socióloga Christa Müller, esse movimento é uma espécie de contrapeso à sociedade neoliberal.

Esses novos urbanos "ficam felizes de produzir algo eles mesmos, no lugar de encher o carrinho no supermercado", considera Burkhard Schaffitzel, do "Rübezahl Garten".

Fonte: http://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/afp/2014/01/28/hortas-comunitarias-se-popularizam-cada-vez-mais-em-berlim.htm

RÁDIO DIFUSORA DO PARANÁ





sábado, 29 de agosto de 2015

ALIMENTOS ORGÂNICOS



Chapada Diamantina se especializa na produção de alimentos orgânicos


sexta-feira, 21 agosto, 2015 às 8:51 | Atualizado em: 21 agosto, 2015 às 13:15


Por Verusa Pinho e Caiã Pires


Segundo o Ministério da Agricultura, o Brasil já ocupa posição de destaque na produção mundial de orgânicos. Com alimentos de melhor qualidade e, consequentemente, mais nutritivos, esse sistema de cultivo tem sido a melhor opção para garantir a preservação do equilíbrio ambiental e a saúde de produtores e consumidores. Dispensando o uso de fertilizantes sintéticos, agrotóxicos e transgênicos, a agricultura orgânica prioriza a redução do desperdício e ajuda a manter a biodiversidade.
Fazenda Ceral, uma das áreas da Bioenergia Orgânicos
Fazenda Ceral, uma das áreas da Bioenergia Orgânicos
Diante desse cenário promissor, as condições climáticas favoráveis e os recursos hídricos disponíveis fizeram a Chapada Diamantina ser a região escolhida para se tornar um grande polo na produção de fruticultura tropical orgânica. Desde 2009, uma das suas famosas cidades turísticas, Lençóis, conhecida internacionalmente pela rica história e belezas naturais, tornou-se a sede daBioenergia Orgânicos, empresa brasileira que pretende implantar um grande complexo industrial na região.
“Idealizamos a Bioenergia há dez anos, visando à área do agronegócio, e decidimos que seria através da agricultura orgânica. Pesquisamos todos os estados, chegamos à Bahia e à Chapada Diamantina. A pesquisa se iniciou em 2006 e, três anos depois, instalamos a empresa em Lençóis, lugar que oferece todas as condições exigidas pelo projeto: áreas virgens, reserva pra servir de cortina natural, clima adequado, água e mão de obra sem o vício da agricultura convencional – com destaque para a participação de trabalhadores das comunidades quilombolas de Una e Remanso. Desde 2010, contamos com a parceria da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) Mandioca e Fruticultura, que assessora nossas atividades com pesquisa e tecnologia”, explica Osvaldo Araújo, ao lado do sócio Evanilson Montenegro, responsáveis pelo projeto.
Antes de começar a colher os primeiros frutos, foi preciso preparar o terreno. “Primeiramente, plantamos a alimentação do gado, para aproveitar o esterco como adubo. Além de espécies típicas, a exemplo da manga-espada, recebemos mudas elaboradas pela Embrapa, com bom desempenho no sistema orgânico de cultivo, como resistência a algumas pragas e doenças. Dentre as variedades, estão manga, maracujá, abacaxi, acerola e goiaba. Hoje dispomos de frutas exóticas funcionais, como a jabuticaba, que está sendo desenvolvida junto com a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Neste ano, vendemos os primeiros abacaxis para localidades da própria Chapada e até para São Paulo, recebendo elogios pela qualidade do produto. Agora iremos buscar a certificação, pois já temos um plano de produção consistente”, acrescenta Araújo.
Fruto do Maracujá
Na fase experimental, o próximo passo é envolver os agricultores familiares, através das cooperativas e associações. “A nossa pretensão é formar parcerias produtivas, oferecendo o suporte técnico e garantindo a compra em contrato. A meta é estabelecer produção própria de 1.400 hectares e comprar a produção de outros 1.400ha dos agricultores regionais”, descreve Araújo. No distrito de Tanquinho, a empresa irá implantar um grande complexo industrial, para abrigar a diversidade produtiva da Chapada. “Inicialmente pensamos na fabricação de sucos, mas nossa intenção é aproveitar tudo para não gerar resíduo. Em virtude da qualidade dos frutos, decidimos comercializá-los in natura, ao lado da produção de polpa. Almejamos adentrar na área medicinal e estética também, com a extração de óleos essenciais (alguns países já nos procuraram, solicitando preferência na venda). Esperamos alavancar o desenvolvimento do setor na região, abrangendo diversos municípios, como Andaraí, Mucugê e Iraquara. Queremos tornar a Chapada Diamantina especialista em orgânicos. Produzir alimentos saudáveis é o futuro!”, pontua o empresário.
Dia de Campo
Troca de experiências no 1º Dia de Campo realizado pela empresa
Troca de experiências no 1º Dia de Campo realizado pela empresa
Rodeadas pelo Rio Santo Antônio e o minipantanal Marimbus, três áreas compõem o espaço da Bioenergia: as fazendas Bonita, Grama e Ceral. Esta última, localizada na estrada do Remanso, foi destinada à produção experimental e recebeu, no último sábado, 15/8, representantes do governo, agricultores, técnicos, engenheiros e profissionais de diferentes campos interessados no tema, durante o 1º Dia de Campo realizado pelo projeto. Na ocasião, pesquisadores e engenheiros da Embrapa explicaram os detalhes das principais práticas no cultivo de abacaxi, manga e maracujá orgânicos, que demandam maior cuidado, como a produção de mudas sadias pela técnica de seccionamento do talo.
Demonstração sobre o plantio de abacaxi orgânico
Demonstração sobre o plantio de abacaxi orgânico
Para o jornalista e proprietário rural em Lençóis, João Neiva, o Dia de Campo foi uma oportunidade de aprofundar os conhecimentos no assunto. “Na nossa comunidade [Riachãozinho], a consciência sobre o orgânico está em evidência. Todo mundo só fala nisso! Pretendemos investir no plantio de manga e café orgânicos”, comentou.
Lorena Coelho, a Lila, do Grupo Ambientalista de Lençóis (GAL), esteve no evento e enfatizou a importância das ações sustentáveis. “No GAL, produzimos hortaliças para consumo próprio, plantas medicinais e frutíferas, inspirados pela agroecologia. Com a Bioenergia, pretendemos trocar informações e firmar parcerias”, disse.
Com foco no cultivo de café orgânico em Seabra, Piatã e Ibicoara, a Cooperativa dos Produtores Orgânicos e Biodinâmicos da Chapada Diamantina (CooperBIO) marcou presença no Dia de Campo. Na opinião de Seu Edilson Lopes, integrante do grupo, foi uma maneira de aprender com os estudiosos e ficar por dentro das novidades.
Kling Dantas, agrônomo e gerente comercial da Meri Pobo Agropecuária, de Jaguaruana (CE), veio para a Chapada só para participar do evento. “Há 15 dias, vim conhecer a Embrapa, em Cruz das Almas. Foi quando soube da atividade em Lençóis e me interessei. Na nossa propriedade, estamos começando o cultivo de orgânicos e precisamos conhecer os aspectos dessa produção. A Chapada Diamantina é uma região fantástica!”, contou Dantas.
Variedades de maracujá  cultivadas pelo projeto
Variedades de maracujá cultivadas pelo projeto
Orgânicos Premiados
Mel, cachaça e café se destacam entre os produtos orgânicos da Chapada Diamantina, premiados e reconhecidos internacionalmente pela sua qualidade. Com certificação orgânica e biodinâmica, a Cachaça Serra das Almas, produzida na Fazenda Vaccaro, em Rio de Contas, foi eleita a melhor cachaça prata do país pela revista VIP em 2011. O mel Flor Nativafabricado de forma coletiva por integrantes da Associação de Apicultura e Meliponicultura do Vale do Capão, em Palmeiras, tem certificação orgânica e já foi premiado como o melhor nos Congressos Baianos de Apicultura em 2005, 2012 e 2013, e, em 2009, no Congresso Nordestino de Apicultura. A Chapada ainda tem história com o café, exportado até para o Vaticano.
Fotos: Caiã Pires

Fonte: http://www.guiachapadadiamantina.com.br/chapada-diamantina-se-especializa-na-producao-de-alimentos-organicos/

GENOCÍDIO SEM FIM***




"Em quinhentos anos de luta não nos deixamos abater, então não é agora que vamos deixar."

Babau Tupinambá é cacique da aldeia de Serra do Padeiro, 
localizada na Terra Indígena (TI) 
Tupinambá de Olivença, no sul da Bahia.

Assassinatos de indígenas disparam no Brasil, comprova relatório do Cimi


Agência Senado
Publicado: 
INDIO
Foto: VALTER PONTES/COPERPHOTO/ESTADÃO CONTEÚDO

relatório 'Violência contra os Povos Indígenas do Brasil', referente a 2014, aponta um aumento dos casos de violência e violações contra integrantes das comunidades indígenas. No período, 138 índios foram assassinados, contra 97 casos no ano anterior. Um dos dados mais alarmantes é o número de suicídios, que chegou a 135, ante 73 ocorrências em 2013.
Produzido pelo Conselho Indigenista Missionário (Cimi), organismo vinculado à Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), o relatório foi debatido em audiência pública nesta quarta-feira (5), na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa (CDH). A antropóloga Lúcia Helena Rangel salientou que o relatório ainda é uma expressão parcial da realidade, pois o Cimi não consegue captar todas as ocorrências em todo o País.
"Mesmo assim, os registros são assustadores", comentou a antropóloga, coordenadora da pesquisa.
O debate foi proposto pelo senador Telmário Mota (PDT-RR), que se revezou na direção dos trabalhos da audiência com o presidente da comissão, Paulo Paim (PT-RS). Na avaliação dos convidados, os fatores de estímulo à violência são antigos e decorrem fundamentalmente da negação do direito à terra, da disputa em torno de áreas indígenas e conflitos possessórios.
"O que vemos é o não reconhecimento, por parte do Estado, às comunidades indígenas, que permanecem tendo seus direitos negados", observou Lúcia Rangel.
Mesmo no caso dos suicídios, o entendimento é de que em grande medida as ocorrências estão relacionadas à falta de perspectivas para indivíduos que precisam da terra para viver e trabalhar, em harmonia com suas culturas. Os 135 casos de 2014 configuram o maior número em 29 anos, com predomínio de ocorrências no Mato Grosso do Sul (48), notadamente entre índios Guarani-kaiowá.
A mortalidade na infância foi ainda apontada como indicador de situação de violação de direitos: o relatório registra 785 mortes de crianças indígenas, na faixa de 0 a 5 anos, contra 693 no ano anterior. A situação mais grave se situa entre os índios Xavantes, no Mato Grosso, com a taxa de mortalidade chegando a impressionantes 141,64 mortes por mil crianças. Já média nacional registrada pelo IBGE, em 2013, foi de 17 por mil.
Segundo o relatório, em 2014 mais do que dobraram os registros de invasões possessórias, exploração ilegal de terras indígenas e outros danos ao patrimônio. Enquanto em 2013 foram 36 ocorrências, em 2014 aconteceram 84 casos.
Funai
O ex-senador João Pedro Gonçalves da Costa (PT), que assumiu em junho passado o comando da Fundação Nacional do Índio (Funai), destacou a importância da audiência diante da “dívida histórica” que o País tem com os povos indígenas. Reconheceu que é essencial avançar na questão das terras indígenas. "Não pode haver índio sem terra; os povos indígenas não podem viver sem história do lugar ponde pisaram seus ancestrais", defendeu.
João Pedro anunciou a intenção de percorrer de imediato as aldeias de todo o País, começando pelo Mato Grosso, lugar de conflitos possessórios mais graves. Também salientou o papel do Congresso e do Judiciário, além de Estados e prefeituras, na solução dos problemas. Depois, apelou aos senadores por apoio para reforçar o orçamento da Funai, por meio de emendas parlamentares.
Entre os senadores, as manifestações foram de solidariedade às demandas dos povos indígenas. Para a senadora Simone Tebet (PMDB-MT), existe a perspectiva de solução para os conflitos sobre terras. Mostrou otimismo com a aprovação de proposta de emenda constitucional (PEC 71/2011) que prevê pagamento de indenizações a produtores que estejam em posse “mansa e pacífica” das terras, o que agilizará a devolução das áreas aos índios.
"Estratégia de ataque"
O secretário-executivo do Cimi, Kleber Cesar Buzato, denunciou o que definiu como a “estratégia anti-indígena” no País. Um dos objetivos seria impedir o reconhecimento e a demarcação das terras tradicionais que continuam invadidas, na posse de não-índios. Outro seria reabrir e rever procedimentos de demarcação já finalizados. Por fim, disse que há ainda o interesse em invadir, explorar e mercantilizar as terras já demarcadas e sob a posse de índios.
"Se não tomarmos iniciativas muito firmes, coordenadas e articuladas, a tendência é de se aprofundar ainda mais esse quadro de violências contra os povos indígenas", alertou.
Em seguida, Buzato listou iniciativas e decisões adotadas, em separado, pelo Executivo, Legislativo e o Judiciário que, a seu ver, traduzem interesses de ruralistas, mineradoras e empreiteiras, entre outros segmentos do mercado. Uma delas seria o Decreto 7.957/2013), que regulamenta a atuação das Forças Armadas no “combate a povos e comunidades locais” que resistirem a empreendimentos em seus territórios. Outra veio por meio da Portaria Interministerial 60/2015, que define procedimentos a serem seguidos pela Funai para licenciamento ambiental de empreendimentos que impactam essas terras.
No âmbito do Legislativo, um dos projetos é o PL 161/1996, da Câmara dos Deputados, que regulamenta a mineração em terras indígenas, com abertura à exploração pelo setor privado, que hoje é vedada. Foi citada ainda uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC 215/2000), que transfere ao Congresso o poder de demarcar e rever a processos de terras indígenas já demarcadas.
"Na prática, significa atribuir à bancada ruralista o poder de decidir ou não sobre a demarcação das terras. Se aprovada, a tendência é não passa mais nada", comentou.
Quanto ao Judiciário, Buzato mencionou julgamento da 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal que atribuiu interpretação mais restritiva a dispositivo constitucional que define o conceito de “terra tradicionalmente ocupada pelos povos”. Com base nessa decisão, segundo ele, foi possível anular atos administrativos de demarcação de terras de povos Guarani-Kaiowá e Terena, no Mato Grosso do Sul, e do povo Canela-Apãniekra, no Maranhão.
Desamparo
Alberto Terena, representante do Povo Terena e da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib), afirmou que os povos indígenas e seus líderes vivem uma situação de desespero diante do permanente desrespeito a seus direitos. Segundo ele, a luta não começou com a atual geração nem as anteriores, mas desde que os colonizadores europeus ocuparam o País. Lembrou que os Terena, hoje com mais de seis mil indivíduos, dispõem de reserva com pouco mais de 2 mil hectares e esperam longamente pela devolução de terras esbulhadas.
"Achavam que éramos poucos e que seríamos exterminados ou integrados à sociedade. Mas isso não aconteceu, e a nova geração se multiplica; por isso, precisamos das nossas terras", comentou.
Outro líder, Kâhu Pataxó, da Federação Indígena das Nações Pataxó e Tupinambá do Extremo Sul da Bahia, relatou a ocorrência de regulares conflitos na região e o assassinato de índios que lutam pela recuperação de suas terras. Também denunciou o uso excessivo de força, seja por efetivos da Polícia Federal ou da Polícia Militar do estado, na tentativa de retiradas dos índios das terras. A seu ver, esses conflitos vão de fato se agravar se vier a ser aprovada a PEC 215.
"O que vamos ver é o extermínio final dos índios", comentou, antecipando que as comunidades estão dispostas a dar a vida para garantir suas terras.
Antonio Carlos Moura, que falou pela Comissão Brasileira de Justiça e Paz, também vinculada à CNBB, também apontou ações de “conluio” entre o Estado brasileiro e segmento econômicos na continuidade do esbulho de terras e direitos dos índios. Destacou a recente encíclica do papa Francisco como fonte de inspiração para luta pelo reconhecimento desses direitos.
Participou ainda da audiência a antropóloga Patrícia de Mendonça Rodrigues, que comoveu colegas e plateia com o relato da história dos Avá-Canoeiro do Araguaia, também mencionada no relatório da Comissão Nacional da Verdade, de 2014. Caçadores, eles chegaram à região fugindo das frentes de colonização. Por seguidas gerações, foram atingidos por incêndios de aldeias, ações de caçadores de índios e ataques de tribos inimigas, com sucessivos massacres.
Já reduzidos a menos de dez indivíduos, foram então pegos, com a ajuda de agentes do aparelho de repressão. Passaram a viver em área de uma fazenda do Bradesco, submetidos a violências e privações. Só não desapareceram completamente porque se reproduziram, por meio de uniões com indivíduos de outras etnias (Javaé, Tuxá e Karajá). Hoje somam pouco mais de 20 pessoas.

Fonte: http://www.brasilpost.com.br/2015/08/07/assassinatos-indios-brasil_n_7949230.html


Como a Ditadura Militar matou 8 mil índios na Amazônia


Índios na década de 70 / Edílson Martins
Índios na década de 70 / Edílson Martins
No dia 1º de abril de 1964, o presidente João Goulart foi deposto e o Brasil entrou em um período de 21 anos sem democracia. Estava instalado o regime militar no país, onde cinco generais do Exército se revezaram no poder, sempre eleitos sem o voto do povo. No ano passado, o golpe completou 50 anos e há um extenso material disponível na internet sobre o assunto. Nesta semana, em que o início de um dos períodos mais negros da nossa história completa aniversário, o História do Dia conta um pouco sobre como o Regime Militar matou mais de 8 mil índios nas florestas da região norte do país. Toda violência foi motivada por dinheiro, corrupção e também por simples maldade.
Segundo o relatório final da Comissão Nacional da Verdade (CNV), 8.350 índios foram mortos durante os anos da Ditadura Militar. Mas os pesquisadores estão convictos de que esse número é imensamente maior, já que foi possível estudar apenas uma pequena parte dos casos. Toda essa matança foi encoberta pelo governo, que aliás, era quem promovia verdadeiras chacinas em nome do progresso.
O órgão responsável por cuidar dos indígenas era a Fundação Nacional do Índio (Funai), que por sua vez, era subordinado ao Ministério do Interior. Essa pasta era a que formulava políticas de desenvolvimento, como por exemplo, a abertura de estradas. Em 1970, o então presidente Emílio Garrastazu Médici lançou o Plano de Integração Nacional (PIN).
O governo militar, com a justificativa de que queria povoar a região norte e ligá-la as outras áreas do Brasil, lançou diversos programas de desenvolvimento. Isso incluía a construção de estradas que cortariam a Floresta, como por exemplo, a Transamazônica, que até hoje não tem asfalto. O governo também estimulou a pecuária nas terras da Amazônia e forneceu recursos para grandes latifundiários civis e militares. Mas para abrir espaço para passarem os carros, caminhões e bois, os governantes precisavam remover os índios. E aí que os problemas dessa população começaram.
O próprio Ministério do Interior mapeou que no caminho da Transamazônica estavam grupos indígenas de 29 etnias diferentes, sendo que 11 deles jamais tinham tido contado com o homem branco. O levantamento produzido pelo ministério recomendou que 30 desses grupos fossem “pacificados”. Mas na verdade eles foram dizimados.
Índios assustados ao verem um helicóptero sobrevoando a aldeia / Edílson Martins
Índios assustados ao verem um helicóptero sobrevoando a aldeia / Edílson Martins
Em 1967, o procurador da república Jader de Figueiredo Correia fez uma expedição pela Amazônia para investigar as violações aos direitos dos índios. De acordo com o Ministério Público Federal, foram percorridos mais de 16 mil quilômetros e foram visitadas mais de 130 povoados indígenas. Foi constatado que os militares assassinaram índios com metralhadoras e dinamites atiradas de aviões, inoculações propositais de varíola em povoados isolados e doações de açúcar misturado a estricnina (veneno). Esse relatório, que ficou conhecido como Figueiredo, ficou perdido por 45 anos e foi encontrado no Museu do Índio, no Rio de Janeiro, em 2013. Ele foi entregue para os pesquisadores do CNV.
No estudo do CNV, ainda foram apontados outros fatores de descompromisso com a preservação dos índios. Durante as remoções, os índios que sobreviviam eram postos próximos de aldeias inimigas, por exemplo. Ou a falta de cuidado com a aproximação com povos que não tinham contato com brancos, que se infectaram com diversas doenças. Além dos inúmeros casos de estupros aos quais as mulheres indígenas foram submetidas por operários das obras do PIN.
Todos os relatórios consultados para esse texto estão disponíveis na internet. Para acessar o da Comissão Nacional da Verdade, clique aqui. O relatório Figueiredo pode ser lido em três partes diferentes: Parte 1Parte 2 e Parte 3.
Fonte: http://blogs.odia.ig.com.br/historia-do-dia/2015/03/31/como-a-ditadura-militar-matou-8-mil-indios-na-amazonia/

O extermínio documentado

Documento que registra extermínio de índios é resgatado após décadas desaparecido

Relatório de mais de 7 mil páginas que relatam massacres e torturas de índios no interior do país, dado como queimado num incêndio, é encontrado intacto 45 anos depois



 postado em 19/04/2013 06:00 / atualizado em 19/04/2013 08:35
Marcelo Zelic/ Divulgação

Depois de 45 anos desaparecido, um dos documentos mais importantes produzidos pelo Estado brasileiro no último século, o chamado Relatório Figueiredo, que apurou matanças de tribos inteiras, torturas e toda sorte de crueldades praticadas contra indígenas no país – principalmente por latifundiários e funcionários do extinto Serviço de Proteção ao Índio (SPI) –, ressurge quase intacto. Supostamente eliminado em um incêndio no Ministério da Agricultura, ele foi encontrado recentemente no Museu do Índio, no Rio, com mais de 7 mil páginas preservadas e contendo 29 dos 30 tomos originais.

Em uma das inúmeras passagens brutais do texto, a que o Estado de Minas teve acesso e publica na data em que se comemora o Dia do Índio, um instrumento de tortura apontado como o mais comum nos postos do SPI à época, chamado “tronco”, é descrito da seguinte maneira: “Consistia na trituração dos tornozelos das vítimas, colocadas entre duas estacas enterradas juntas em um ângulo agudo. As extremidades, ligadas por roldanas, eram aproximadas lenta e continuamente”.

Entre denúncias de caçadas humanas promovidas com metralhadoras e dinamites atiradas de aviões, inoculações propositais de varíola em povoados isolados e doações de açúcar misturado a estricnina, o texto redigido pelo então procurador Jader de Figueiredo Correia ressuscita incontáveis fantasmas e pode se tornar agora um trunfo para a Comissão da Verdade, que apura violações de direitos humanos cometidas entre 1946 e 1988.

A investigação, feita em 1967, em plena ditadura, a pedido do então ministro do Interior, Albuquerque Lima, tendo como base comissões parlamentares de inquérito de 1962 e 1963 e denúncias posteriores de deputados, foi o resultado de uma expedição que percorreu mais de 16 mil quilômetros, entrevistou dezenas de agentes do SPI e visitou mais de 130 postos indígenas. Jader de Figueiredo e sua equipe constataram diversos crimes, propuseram a investigação de muitos mais que lhes foram relatados pelos índios, se chocaram com a crueldade e bestialidade de agentes públicos. Ao final, no entanto, o Brasil foi privado da possibilidade de fazer justiça nos anos seguintes. Albuquerque Lima chegou a recomendar a demissão de 33 pessoas do SPI e a suspensão de 17, mas, posteriormente, muitas delas foram inocentadas pela Justiça.

Os únicos registros do relatório disponíveis até hoje eram os presentes em reportagens publicadas na época de sua conclusão, quando houve uma entrevista coletiva no Ministério do Interior, em março de 1968, para detalhar o que havia sido constatado por Jader e sua equipe. A entrevista teve repercussão internacional, merecendo publicação inclusive em jornais como o New York Times. No entanto, tempos depois da entrevista, o que ocorreu não foi a continuação das investigações, mas a exoneração de funcionários que haviam participado do trabalho. Quem não foi demitido foi trocado de função, numa tentativa de esconder o acontecido. Em 13 de dezembro do mesmo ano o governo militar baixou o Ato Institucional nº 5, restringindo liberdades civis e tornando o regime autoritário mais rígido.

 O vice-presidente do grupo Tortura Nunca Mais de São Paulo e coordenador do Projeto Armazém Memória, Marcelo Zelic, foi quem descobriu o conteúdo do documento até então guardado entre 50 caixas de papelada no Rio de Janeiro. Ele afirma que o Relatório Figueiredo já havia se tornado motivo de preocupação para setores que possivelmente estão envolvidos nas denúncias da época antes de ser achado. “Já tem gente que está tentando desqualificar o relatório, acho que por um forte medo de ele aparecer, as pessoas estão criticando o documento sem ter lido”, acusa.

Suplícios 
O contexto desenvolvimentista da época e o ímpeto por um Brasil moderno encontravam entraves nas aldeias. O documento relata que índios eram tratados como animais e sem a menor compaixão. “É espantoso que existe na estrutura administrativa do país repartição que haja descido a tão baixos padrões de decência. E que haja funcionários públicos cuja bestialidade tenha atingido tais requintes de perversidade. Venderam-se crianças indefesas para servir aos instintos de indivíduos desumanos. Torturas contra crianças e adultos em monstruosos e lentos suplícios”, lamentava Figueiredo. Em outro trecho contundente, o relatório cita chacinas no Maranhão, em que “fazendeiros liquidaram toda uma nação”. Uma CPI chegou a ser instaurada em 1968, mas o país jamais julgou os algozes que ceifaram tribos inteiras e culturas milenares.

Fonte: http://www.em.com.br/app/noticia/politica/2013/04/19/interna_politica,373440/documento-que-registra-exterminio-de-indios-e-resgatado-apos-decadas-desaparecido.shtml

“NÃO VAMOS DEIXAR O AGRONEGÓCIO TOMAR O NOSSO PAÍS” – ENTREVISTA COM O CACIQUE BABAU TUPINAMBÁ


26 AGO 2015 

Tiago Miotto, especial para o Jornalismo B
Quando perceberam que teriam que ser revistados pela polícia e enfrentar uma longa fila para adentrar na sessão solene em “homenagem” aos povos indígenas que ocorreria na Câmara dos Deputados, os representantes do povo Tupinambá, vindos do sul da Bahia, decidiram bater em retirada. “Uma casa, quando vai receber para uma sessão solene, não tem de humilhar ninguém dessa forma”, criticou Babau Tupinambá. Junto com seu povo, Babau negou-se a participar da solenidade ocorrida durante o 11º Acampamento Terra Livre (ATL)*, que aconteceu no mês de abril em Brasília.
Babau é cacique da aldeia de Serra do Padeiro, localizada na Terra Indígena (TI) Tupinambá de Olivença, no sul da Bahia. A Serra do Padeiro é uma das muitas comunidades indígenas que tiveram que buscar alternativas para sobreviver frente à violência cotidiana e à morosidade do Estado brasileiro.
Como outras comunidades Guarani-Kaiowá (no Mato Grosso do Sul) e Kaingang (no Rio Grande do Sul), por exemplo, o povo Tupinambá cansou-se da marginalização e da miséria e partiu, em 2004, para a retomada de partes de seu território tradicional no interior da TI Tupinambá de Olivença, cujo processo demarcatório também iniciou naquele ano. A delimitação da TI Tupinambá de Olivença – estimada em 47 mil hectares – foi concluída em 2009 e, desde então, aguarda a expedição da Portaria Declaratória do Ministério da Justiça, emperrada por decisões políticas do governo federal. Enquanto isso, a Polícia Federal e a Força Nacional de Segurança chegaram a ser enviadas para realizar ações de reintegração de posse contra os indígenas na área, o que resultou em diversos relatos de violações contra os indígenas.
Nesse processo, mais de vinte fazendas foram retomadas apenas na área da Serra do Padeiro, e muitas das áreas no interior do território indígena de Olivença, já reconhecido como tradicional do povo Tupinambá, encontram-se ainda sob a posse de não-índios e sob o poder de fazendeiros que não hesitam em contratar jagunços e comandar torturas, atentados e assassinatos contra os indígenas.
Foto: Tiago Miotto
Foto: Tiago Miotto
Durante o ATL, em Brasília, Babau Tupinambá, uma das lideranças ativas nesse processo de retomada, concedeu a entrevista a seguir, em que comenta alguns dos desdobramentos do acampamento que reuniu mais de 1500 indígenas de todo o Brasil durante quatro dias na Esplanada dos Ministérios.
A mobilização ocorreu num momento que é, talvez, o mais adverso enfrentado pelos povos indígenas desde a promulgação da Constituição de 1988. Por um lado, o governo Dilma – o que menos demarcou terras desde a redemocratização – mantém as demarcações paralisadas, por compromisso com a agenda do agronegócio. Por outro, a bancada ruralista avança com as tentativas de retirada de direitos dos povos indígenas, vistos como inimigos do agronegócio e limitadores da expansão das fronteiras agrícolas. Dentre os projetos prioritários dos ruralistas, a Proposta de Emenda Constitucional (PEC 215), que pretende passar do Executivo para o Legislativo a atribuição de demarcar terras indígenas, é o risco mais iminente de retrocesso. Enquanto isso, decisões recentes da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF) desconsideram as violações sofridas pelos indígenas durante a Ditadura e aceitam recursos de fazendeiros para processos demarcatórios já concluídos.
Na entrevista, Babau também falou sobre a situação do povo Tupinambá, a relação com o Estado brasileiro e a prisão que sofreu em 2014, quando iria levar ao Papa Francisco, no Vaticano, um relatório denunciando as violações contra os direitos humanos sofridas pelos povos indígenas do Brasil. Na ocasião, Babau foi impedido de retirar seu visto e ficou sob custódia da Polícia Federal, em função de um mandado de prisão expedido dois meses antes pela Justiça da Bahia e motivado por uma denúncia de assassinato, a qual foi caracterizada por Babau como perseguição política.
Para se ter uma ideia da situação de insegurança e constante violência a que estes povos indígenas estão submetidos, vale lembrar que, desde a data em que a entrevista foi concedida, duas lideranças indígenas foram assassinadas na Bahia (entre elas um Agente de Saúde Indígena do povo Tupinambá) e uma no Maranhão, além de um atentado com fogo que aconteceu contra uma comunidade Tupinambá, também na Bahia. A indignação e inquietação de Babau não são frutos do acaso.
Jornalismo B – Babau, em uma fala tua, tu comparaste a PEC 215 com a primeira lei colonial brasileira. Por quê?
Babau Tupinambá – Quando a coroa portuguesa chegou no Brasil, dividiu o Brasil em capitanias hereditárias e, ao entregar aos donatários essas capitanias, junto veio uma lei, uma regra para que eles provassem que eram leais à coroa portuguesa, então, tinham por obrigação matar todos os índios Tupinambá que eles encontrassem dentro das capitanias. Então, é uma sequência de leis, de regras para matar e exterminar um povo.
Porque uma foi taxativa, disse: “mate”. A outra não tá dizendo “mate”, mas o efeito é o mesmo, vai expulsar da terra, tirar da terra, então é a PEC da morte. A ordem de Portugal era matar os Tupinambá para tomar terra, não é isso? E a PEC vai fazer o quê? Se não vai ter terra demarcada, se eles vão rever as terras demarcadas, então, é a mesma lei, eles só mudaram o viés. Você não sabe que aqui no Brasil eles não chamam o cara de ladrão, chamam de corrupto, que ele “fraudou”? A PEC assassina é a mesma coisa, só não diz “mate”, mas o efeito é o mesmo.
Na situação da PEC ser aprovada, quais seriam as consequências disso?
As consequências, se essa PEC passa… o povo brasileiro é um povo ordeiro, principalmente nós, índios. Mas não tem outro jeito a não ser ir para a guerra, querendo ou não, os índios vão ter que formar guerrilha. Se é pra morrer, tem que morrer lutando, não sentado. Não vamos deixar tomarem o nosso país, esse agronegócio, seja quem for. Nós, indígenas, temos a obrigação e o dever de defender a nossa vida e a existência dos animais e da floresta. Nós só existimos se isso existir. Se vão mexer, vai ter que mexer com a vida no todo e ainda vão tentar também tirar a vida.
Ano passado aconteceu uma situação contigo em que tu estavas indo levar um relatório para o Vaticano e tu foste impedido de ir pela Justiça. Queria saber a tua versão, o que foi que aconteceu?
Foto: Lucio Bernardo Jr. - Câmara dos Deputados
Foto: Lucio Bernardo Jr. – Câmara dos Deputados
É mais uma questão fraudulenta, das armações políticas aqui desse país. Eu tirei esse bendito passaporte, em um dia nada constava na minha ficha, no dia seguinte apareceram quatro mandados de prisão. E o último que ficou, inicialmente, era que eu era assassino, matei uma pessoa. Depois, se chegou à conclusão de que eu nem conhecia as pessoas. Como eu vou matar quem eu nem conheço e a mais de 60km da minha aldeia?
E por que tu achas que aconteceu essa armação e que tu foste impedido de viajar?
Ah, inclusive alguns parlamentares aí citaram, como que podia, eles, parlamentares, não foram convidados pelo papa, como que um cacique ia ser convidado pelo papa, que eles não podiam deixar sair do país para difamar, coisas assim.
E tu estavas levando um relatório para o papa?
Eu ia não só levar o relatório, mas eu ia falar ao papa – e falei isso pro Marcelo Veigas, do Ministério da Justiça – todas as atrocidades que acontecem aqui no Brasil com os povos indígenas do país inteiro, eu ia falar tudo. E uma hora dessas eu vou falar.
Observando de maneira mais geral, como tu vês a situação dos povos indígenas no Brasil hoje?
A situação que eu vejo hoje é caótica, porque o povo reclama, mas muitos não querem agir. Um povo ou outro reage, mas não todos. Todos falam em agir, mas na prática tão ainda se segurando no Bolsa-Família, e tem que abandonar esse negócio. O índio tem que ir pra terra, produzir dentro da sua cultura, no regime cultural do seu povo, e sair dessa de ficar recebendo cesta básica, Bolsa Família, esquece isso. Nosso povo é um povo independente, um povo livre, não submisso a um recurso banal desse, de cesta básica. Tem que se livrar disso, ir para a luta e garantir o direito à vida da floresta, dos animais e de nós índios.
E especificamente sobre os Tupinambá, qual é a situação de vocês hoje?
Nós, o povo Tupinambá, hoje estamos ocupando nosso território, [independentemente] se eles demarcaram e vão publicar a portaria declaratória ou não, o certo é que a gente expulsou os fazendeiros de dentro, e estamos lá, e para tirar nós tem que matar nós. Então, nós não temos o que fazer. Na questão histórica, nós estamos dentro de uma terra que foi o Ministério da Guerra que demarcou em 1926 e era de cinquenta léguas. E agora, estamos apenas reivindicando dentro dessa terra 47 mil hectares e está essa confusão toda. Nós não entendemos, mas a gente sabe que a terra é nossa, já assumimos, a aldeia Serra do Padeiro já assumiu toda a terra, e cabe ao governo indenizá-los, aqueles que nós tiramos, e publicar a portaria declaratória, fazer a parte que é do governo. A nossa parte nós já fez, já ocupou tudo.
Os Tupinambá foram um dos primeiros povos a entrar em contato com os colonizadores portugueses. Queria saber: nesses mais de 500 anos de contato, na tua visão sobre a relação com o Estado brasileiro, o que mudou?
Nós Tupinambá nunca conseguimos lidar com o Estado brasileiro. Como você viu, a primeira lei do país foi criada para matar Tupinambá. Os portugueses disseram: “olha, Tupinambá é inimigo da coroa. Mate”. Depois, mandaram: “todos os colonos que estiverem no país têm que, por lei, matar os Tupinambá”. E nós sobreviveu. Então, os colonos em muitos anos nunca tiveram capacidade de guerrear com os Tupinambá, então eles mandaram o exército, a polícia, e continua até hoje, você vê que a gente está lutando, mas fazendeiro nenhum nunca foi na terra Tupinambá, é a polícia que eles mandam. Então, o governo sempre foi o entrave para os Tupinambá.
Durante o Acampamento Terra Livre houve uma reunião com o Eduardo Cunha (PMDB-RJ, presidente da Câmara dos Deputados), uma sessão na Câmara dos Deputados e outra no Senado. Qual a tua avaliação desses espaços e qual o saldo que fica deles para os povos indígenas?
Olha, eu vejo como saldo zero. Primeiro que é um enrolation, abrir a porta e sentar na mesa significa que o outro te ama ou que vai fazer o que você quer. E isso é só enganação pra encher o ego do índio para dizer que esteve no Congresso. Por isso que nem lá eu fui. Ontem, eu fui com essa do Eduardo Cunha, que foi uma reunião privada, onde nós pudemos falar olho a olho com ele o que a gente acha, o que a gente pensa, e ele também falou, mas solenidade, o que nós temos de solene? 600 índios mortos, presos, torturados, violentados, duas terras indígenas julgadas pelo Supremo contra, então, o que nós temos? Lá eu não fui, não vou, se vamos é para falar de igual para igual, não para sentar como um cachorrinho abanando o rabo para quem quer matar o pobre cachorrinho. Isso não dá, isso nunca prestou e isso tem tudo para acabar mal com os povos indígenas. O correto com essa multidão que está aqui era nós ficar de cá e dizer para o governo o que nós precisamos, o que nós queremos, e nós sabemos o que queremos: queremos nossos direitos todos sendo aplicados nesse país, que realmente eles mandem recurso para a Funai, para ser aplicado, que criem um ministério para os povos indígenas atuar, com um índio ministro, que aprove a lei do deputado Miranda [PEC 320, proposta pelo deputado federal Nilmário Miranda (PT-MG)]que dá direito a nós ter pelo menos cinco deputados federais aqui dentro, aí sim, aí dá autonomia, dá direito e você pode entrar de igual para igual. Agora, chegar ali na porta do Congresso, como você viu hoje, mais de 600 policiais metendo a mão na bunda dos índios, passando a mão para depois entrar, nas mulheres a mesma coisa, nós Tupinambá da porta voltamos, nós não nos sujeitamos a uma humilhação dessas, porque uma casa quando vai receber para uma sessão solene não tem de humilhar ninguém dessa forma. E se é a casa do povo, por que a polícia tá primeiro? Então, achei tudo de ruim, os parentes terem se humilhado e aceitado uma coisa dessas.
E sobre o futuro, quais são, na tua visão, as perspectivas e o que tu acha que precisa para que os direitos dos povos indígenas se concretizem daqui para a frente?
Eu, como Tupinambá, vejo um futuro bom, porque quando fica muito ruim todo mundo vai ter que reagir, e quando reage a coisa melhora. Agora, sem reação, só resta a morte. Então, todo mundo faz um caixãozinho, entra e seja enterrado logo. Como eu sei que ninguém vai ter coragem de se autoenterrar, então, acredito que o povo vai reagir e vai ficar tudo beleza, tudo bom para o futuro. Eu vejo lá no Rio Grande do Sul os parentes reagirem, estão nas terras, povo que tá sempre guerreando eu sei que vai continuar assim e não vai se deixar abater. Em quinhentos anos de luta não nos deixamos abater, então não é agora que vamos deixar.
*A revista o Viés, convidada pelo Conselho Indigenista Missionário (CIMI) e pelo grupo de Apoio aos Povos Indígenas (GAPIN) para acompanhar o 11º Acampamento Terra Livre, realizou na ocasião uma série especial de reportagens sobre alguns dos principais temas em debate durante a mobilização. Para ler as reportagens, acesse: www.revistaovies.com/acampamento-terra-livre.
Fonte:http://jornalismob.com/2015/08/26/nao-vamos-deixar-o-agronegocio-tomar-o-nosso-pais-entrevista-com-o-cacique-babau-tupinamba/
***Título editado