sábado, 24 de novembro de 2018

BRASIL MEIO AMBIENTE

Foto: http://www.mobilizadores.org.br/noticias/estudo-revela-que-e-urgente-processo-de-recuperacao-desmatamento-da-amazonia/



Desmatamento na Amazônia atinge pior marca em dez anos

A remoção total da vegetação (corte raso) na Amazônia atingiu 7.900 km², uma área equivalente a mais de cinco vezes a capital de São Paulo


23 NOV 2018







O governo do presidente Michel Temer encerra seu ciclo com um aumento expressivo nos índices de desmatamento da Amazônia, registrando o pior volume de devastação na região nos últimos dez anos. Dados oficiais do governo apontam uma expansão de 13,7% no desmate da região amazônica no período de agosto de 2017 a julho de 2018, quando comparado com o mesmo ciclo anual anterior. Ao todo, a remoção total da vegetação (corte raso) na Amazônia atingiu 7.900 km², uma área equivalente a mais de cinco vezes a capital de São Paulo.

Trata-se da maior área devastada desde o ciclo de 2007/2008, quando 12.911 km² foram desmatados. Os dados são apurados pelo sistema de monitoramento da Amazônia, o Prodes, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O crescimento na taxa de desmatamento frustra os resultados de queda do período anterior, entre agosto de 2016 e julho de 2017, quando o governo comemorou um recuo de 16% nessas ocorrências, com 6.947 km² desmatados.  
No ano passado, o governo comemorou a "tendência de queda" nos índices. Nos dois ciclos anteriores - agosto de 2014 a julho de 2015 (6.207 km²); e agosto de 2015 a julho de 2016 (7.893 km²) - houve aumento nas taxas de desmatamento, com altas de 24% e 27%, respectivamente.
Os Estados que apresentaram os valores mais elevados de desmatamento foram Pará (35,9% do total), Mato Grosso (22,1%), Rondônia (16,7%) e Amazonas (13,2). O governo procura relevar o resultado ruim, ao observar que o desmatamento de 2018 corresponde a uma redução de 72% em relação à área registrada em 2004, quando 28.772 km² foram desmatados, a maior perda florestal registrada no século 21.
O mapeamento se baseia em imagens de satélite para registrar e quantificar as áreas desmatadas maiores do que 6,25 hectares. Foi considerado como desmatamento a remoção completa da cobertura florestal, independentemente da futura utilização dessas áreas.
Fiscalização
No ciclo 2017/2018, o Ibama aumentou o número de autuações em 6%. As áreas embargadas na região tiveram ampliação de 56%, o volume de madeira apreendida cresceu 131% e a apreensão de equipamentos, alta de 183%, em relação ao período anterior.
Em unidades de conservação ambiental fiscalizadas pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), aumentaram em 40% as autuações, 20% as áreas embargadas e 40% as apreensões de madeira e equipamentos. Como o desmatamento ilegal muitas vezes está associado a outros crimes, como lavagem de dinheiro, tráfico de armas, drogas e animais e trabalho escravo, a Polícia Federal instaurou 823 procedimentos criminais no período.


Fonte: https://www.terra.com.br/noticias/ciencia/sustentabilidade/meio-ambiente/desmatamento-na-amazonia-cresce-137-e-atinge-pior-marca-em-dez-anos,49d4feaa6810472592dfff03cc2b9810iimmk9v2.html?fbclid=IwAR1nyJhJ4bRAyuPz7uUpaSr9YG841YVhuTHpqsH7v4b16CviHHu3ayFBTxA

Mais em: http://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2018-11/desmatamento-na-amazonia-aumenta-137-em-um-ano





sábado, 17 de novembro de 2018

ABELHAS



RIO — O mel é o produto mais visível dos préstimos oferecidos de graça pelas abelhas. Mas, muito além de adoçar nossos alimentos, elas conseguem também adoçar o PIB agrícola brasileiro. Isso porque, dos 141 tipos de culturas agrícolas do país, 85 dependem de polinização por animais, principalmente abelhas. E um estudo da Universidade de São Paulo (USP) estimou que esse serviço prestado de graça gera uma economia de US$ 12 bilhões por ano à agricultura no Brasil.
Este é um dos dados revelados pelo "Primeiro Diagnóstico Brasileiro de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos", lançado nesta quinta-feira, às vésperas da conferência mundial sobre biodiversidade, a COP-14, que acontecerá entre os dias 13 a 29 em Sharm El-Sheik, no Egito.
Elaborado pela Plataforma Brasileira de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (BPBES), que reúne alguns dos maiores especialistas do país no assunto, o diagnóstico aponta desafios e, sobretudo, oportunidades da exploração sustentável da diversidade.

O Brasil abriga 20% da biodiversidade da Terra, ainda tem 40% de sua cobertura vegetal e dispõe de 55 milhões de hectares de terras degradadas pela pecuária que poderiam ser revertidas em plantações, evitando novos desmatamentos, destaca o engenheiro florestal Fábio Scarano, um dos coordenadores da BPBES e presidente da Fundação Brasileira para o Desenvolvimento Sustentável (FBDS).
— Temos uma galinha dos ovos de ouro, e até agora só perdemos oportunidades. Está na hora de mudar o jogo — acredita Scarano.
No jogo está, por exemplo, a morosidade na discussão da ratificação do Protocolo de Nagoia, no Congresso Nacional. O protocolo existe há quatro anos e é o acordo global que regula a repartição dos benefícios da biodiversidade. O Brasil discorda de alguns pontos, mas não desata o nó que dificulta negócios baseados em produtos da biodiversidade.

Também coordenador da BPBES, o biólogo Carlos Joly destaca que a principal causa de perda de biodiversidade no país é o uso errado do solo. As mudanças climáticas também exercem grande influência.
— São as atividades humanas os principais vetores de perda de biodiversidade, seja por perda de habitat, por poluição, por demanda de exploração — afirma ele. — E a realização desse "Primeiro Diagnóstico" confirma que esse cenário vem se acentuando no Brasil de maneira muito rápida, talvez porque sejamos justamente o país com a maior diversidade do planeta.

Mudança de paradigma

O relatório destaca que é preciso uma mudança de paradigma, para que a sociedade civil e os tomadores de decisão passem a entender o desenvolvimento ecológico como parte do desenvolvimento social e econômico.
— A biodiversidade é percebida geralmente como um obstáculo ou no máximo um apêndice ao processo de desenvolvimento quando, na verdade, constituem a base de ganho de competitividade em um ambiente global — ressalta Mercedes Bustamante, também coordenadora da BPBES e reconhecida por seus trabalhos sobre o Cerrado.
Segundo ela, duas iniciativas importantes são o estímulo ao cumprimento das leis ambientais já existentes e a incorporação de serviços ecossistêmicos nas políticas de desenvolvimento do país.
A ideia é que o relatório sirva como base para que os governos federal e estadual e o Congresso Nacional recém-eleitos tomem decisões. É isso, ao menos, o que os cientistas esperam.

— Espero, sinceramente, que os que ocupem os cargos de gestão do governo respeitem a Constituição, para pelo menos o cenário não piorar — diz o engenheiro florestal Fábio Scarano. — Mas acredito que não precisamos depender só do governo também. A mudança que vem de baixo para cima pode ter muita força. A organização dos cidadãos, de ONGs e de empresas pode fazer muito, atuando como contrapesos.

Remédios e cosméticos

O país tem, segundo o diagnóstico, mais de 245 espécies de plantas empregadas em produtos cosméticos e farmacêuticos e 36 registradas como fitoterápicos. Com maior investimento, poderia ter muito mais, destaca a pesquisadora Mercedes Bustamante.
Desse bioma vem um caso de sucesso, indicador do potencial nativo. É de lá a fava d’anta, árvore de cujas vargens se extrai quercetina. Esta é a base da rutina, usada em drogas para retardar o processo de envelhecimento e melhorar a circulação do sangue. O Brasil exporta rutina para 36 países, sendo o laboratório Merck o maior comprador. Em 2017, foram exportados US$ 967.657,00 de rutina proveniente de Maranhão e Piauí.
Bustamante destaca ainda o valor alimentício das plantas nativas. O diagnóstico mostra que 469 espécies de plantas são cultivadas em sistemas agroflorestais. E as frutas brasileiras são as de maior teor de vitaminas A (buriti) e C (camu-camu) do mundo.

— Temos o maior potencial do planeta para melhorar a quantidade e a qualidade dos alimentos e há ainda muitas espécies sequer exploradas — diz Bustamante.

Uma nova espécie a cada três dias

O melhor exemplo de sucesso vem da Amazônia. É o açaí, cujo cultivo hoje está atrás somente da pecuária e da exploração de madeira no Pará. O açaí é o exemplo mais importante do uso sustentável da biodiversidade, afirma o climatologista Carlos Nobre, que desenvolve o projeto Terceira Via Amazônica sobre o valor econômico da exploração sustentável da floresta em pé.
De tão vasta a biodiversidade permanece até agora incalculável. Na Amazônia, o projeto de Nobre se debruça, por exemplo, sobre aplicações farmacêuticas e industriais de moléculas de espécies nativas de micro-organismos, plantas e animais e diz que “em média, uma nova espécie é descoberta a cada três dias”, o que demonstra que o número das ainda não identificadas é colossal.

Soja, café e até tomate dependem da polinização

O adjetivo "colossal" se adequa ao trabalho realizado pelas abelhas no campo. Espécies brasileiras se adaptaram a culturas originárias de outros países, caso da soja, do algodão, do café e do tomate. Hoje os cultivadores daqui mantêm uma relação umbilical com as abelhas sem ferrão.
A soja, o motor do PIB agrícola, depende das abelhas para produzir flores e, assim, grãos. A soja se torna mais produtiva graças aos polinizadores, diz Bustamante. Mesmo as plantas que se autofecundam, caso do tomate, não dispensam os préstimos de espécies nativas de abelhas, observa ela.

Outro que não vive sem uma abelha em sua vida é o café, acrescenta Scarano.  Segundo ele, o café não frutifica sem a polinização por uma espécie de abelha brasileira, do grupo das meliponinas ou abelhas sem ferrão. Mas esta abelha pode estar extinta até 2030, diz Scarano.
— O café dá a dimensão da urgência de garantir a sustentabilidade da biodiversidade — frisa ele.
Urgência não apenas no que diz respeito a alimentos e fármacos, mas também à energia. Um dos destaques do diagnóstico são as usinas hidroelétricas, fontes de dois terços da energia elétrica consumida no país. Elas precisam de água e esta depende da integridade de ecossistemas, especialmente os florestais, afirma o documento.
A urgência se explica não apenas pelo avanço do desmatamento, mas pela constatação de que 40% da cobertura vegetal do Brasil estar concentrada em 400 municípios (o equivalente a 7% do total do país) onde estão 13% da população que vive na pobreza.
— A pobreza é um dos vetores do desmatamento. Mas a biodiversidade pode oferecer formas de gerar renda mais lucrativas e sustentáveis do que a derrubada da floresta. O sucesso do açaí na Amazônia ilustra isso. É mais questão de vontade e estratégia política — afirma Scarano.

Os números da biodiversidade

O "Primeiro Diagnóstico Brasileiro de Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos", documento lançado nesta quinta-feira e elaborado por mais de 120 autores — entre pesquisadores, gestores ambientais e tomadores de decisão —, compila uma série de dados sobre a biodiversidade brasileira. Seguem abaixo alguns dados de destaque:

- O território nacional abriga cerca de 42 mil espécies de vegetais, 9 mil espécies de animais vertebrados e 129 mil invertebrados conhecidos.
- O Brasil exporta mais de 350 tipos de produtos agrícolas, e a agricultura familiar produz 70% do que os brasileiros comem e bebem.
- Das 141 culturas agrícolas analisadas no Brasil, 85 dependem de polinização por animais.
- O país é o terceiro maior país exportador de produtos da silvicultura, responsável por 3,64% do volume total do mercado global.
- Cerca de 80 famílias e 469 espécies de plantas são cultivadas em sistemas em sistemas agroflorestais no Brasil.
Colaboração: Rafhael Fumagali
Fonte: https://oglobo.globo.com/sociedade/sustentabilidade/biodiversidade-galinha-de-ovos-de-ouro-desperdicada-no-brasil-mostra-relatorio-23220249?fbclid=IwAR1UdTuPPRO_aA086eYeCNH2GGZ65czWdf7l4-BO7E_7hC_T0Xo6kNFwlyg

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

POLÍTICA & PASOLINI

Fascismo, teu novo nome é Consumismo





Como Pasolini enxergou, desde 1968, que a ameaça já não estava nos Estados totalitários — mas no homem-consumidor individualista, refratário ao coletivo, entregue à mercantilização. O que isso tem a ver com o Brasil de 2018

Por Fran Alavina
Mesmo após sua morte atroz, em novembro de 1975, Pasolini não deixou de incomodar. Uma de suas últimas polêmicas, expressa nos seus textos (Scritti Corsari e Letterre Luterane), bem como no seu último filme Salò, era a afirmação do nascimento de um novo tipo de fascismo. Desta nova forma de totalitarismo disfarçado, o pensador italiano estava bem certo. Exatamente por isso, ocupava uma posição de deslocamento entre os intelectuais de seu tempo. Os contemporâneos viam seu diagnóstico do presente como algo exagerado. Uma visão que, segundo eles, diria muito mais sobre a personalidade de Pasolini, do que sobre seu próprio tempo.
Enquanto todos se contentavam com os avanços do estado de bem-estar social e estavam inebriados com o maio de 68, dificilmente poderiam compreender que Pasolini não se reportava aos riscos da volta do fascismo histórico, como aquele de Mussolini. Tratava-se, na verdade, de uma mutação do fascismo histórico, cuja gênese estava justamente naquilo que o estado de bem-estar social comportava em seu interior e que era um dos motivos de sua expansão: o consumismo. Ao mesmo tempo em que surgia uma nova cidadania, das benesses da social democracia, esta também ensejava um novo modelo de homem e mulher: o consumidor.
Hoje, com a volta da extrema direita e sua chegada ao poder em alguns países, os ambientes intelectuais ora se veem imóveis, incapazes de diagnosticar com precisão um fenômeno que aparece dramaticamente como algo inesperado, ora se movimentam para atestar sua existência — mas buscam compreendê-lo segundo o parâmetro do fascismo histórico. Logo, deixam escapar os novos elementos e as novas determinações.

É claro que o fascismo histórico não pode ser esquecido, pois é o modelo mais acabado do que foi um estado fascista, institucionalmente falando. Ocorre que, como apontava Pasolini, o novo fascismo não é, em primeiro lugar, institucional — mas sim uma nova forma de vida jamais vista, e por isso mais difícil de ser combatida. Ele esconde dentro de si uma nova lógica de poder, está mais arraigo nos indivíduos que em instituições ou oficialidades declaradas. Por isso, Pasolini referia-se a uma nova forma de poder: “anárquico”, sem centro específico e sem uma estética que pretensamente expresse identidade homogênea — ao contrário do que foi o fascismo histórico.
A negação da diferença não seria, advertiu o pensador italiano, feita pela força bruta. Decorreria da não aceitação de qualquer forma de vida individual ou social que não pudesse ser transformada em mercadoria — isto é, que não se adaptasse ao consumo. Como era necessário que o consumo acompanhasse o aumento da produção, o novo cidadão do estado de bem-estar social deveria ser levado cada vez mais à mercantilização da vida.
Daí que durante as ocorrências do maio de 68 pela Europa, Pasolini já denunciava seus limites e a acomodação do espírito de rebeldia pelo mercado. A própria rebeldia perdia sua valência política e tornava-se uma marca, um slogan. As novas formas de comportamento, quanto mais possam parecer novas, mais se acomodam ao consumo que já faz de si mesmo a imagem da única novidade possível. Este novo fascismo, que ao que parece só Pasolini conseguia ver, seguia os passos do fascismo histórico, pois instaurava uma nova linguagem: pobremente denotativa, como fora aquela que se materializava nos discursos de Mussolini.
Assim, o novo fascismo trazia consigo um novo gestual que, segundo as palavras de Pasolini, impedia que se pudesse diferenciar, na Europa, um jovem das classes populares de um jovem burguês. Os dois já falavam do mesmo jeito, já gesticulavam do mesmo modo: enfim, todo o campo da expressividade havia se tornado único. Desfazendo, desse modo, qualquer referência às diferenças entre classes sociais. Ora, não era o sonho do fascismo histórico produzir um tipo de sociedade radicalmente homogênea?
Não parece, pois, ser mera coincidência que hoje os gestos e a linguagem da extrema direita tenham se tornando tão aderentes nas redes sociais. Também sendo pobremente denotativa, a linguagem das redes sociais levou o consumo ao seu ponto máximo: já não se consumem coisas, pode-se consumir pessoas. A transformação das subjetividades em algoritmos impõe um novo padrão de homogeneidade. Aqueles que já não falam a língua das redes, mesmo fora delas, tendem a desaparecer, pois só aqueles que falam a língua do consumo imediato permanecem. Não é pura ocasionalidade que os políticos de extrema direita falem como se youtubers fossem. Trump não discursa como se estivesse no twitter? Mas essa nova linguagem pressupõe aderência entre os falantes: portanto, supõe que os falantes já se identifiquem apenas como consumidores.
Também não é mera coincidência que o atual estado de coisas a que chegamos no Brasil tenha sido precedido por uma ascensão e crise das classes populares ao consumo. A classe trabalhadora, falsamente identificada como nova classe média, passou a ver a si mesma como consumidora, mais do que com qualquer outra identidade. O mesmo movimento se deu naqueles países europeus mais afetados com a crise econômica de 2008.
Os antigos consumidores jogados para fora dos padrões de consumo não se voltam mais, como outrora, aos partidos trabalhistas ou de centro esquerda (pois foram estes os principais fiadores da social democracia e seu estado de bem-estar). Não se veem mais como trabalhadores expropriados, mas como consumidores incapazes de consumir. A afirmação da identidade de classe foi perdida. Por isso, no caso brasileiro, por exemplo, não aparece como contradição seguir um discurso que promete a volta dos empregos por meio de uma agenda neoliberal extremada e que ao mesmo tempo retira direitos dos trabalhadores.
Se o fascismo histórico se guiava pela noção de um aparelho estatal grande e forte, o novo fascismo pode aderir ao estado mínimo justamente por não se tratar mais de instituições, mas de formas de vida que consomem a si mesmas. Logo, a aderência do discurso da meritocracia, que cria a imagem da sociedade como um grande aglomerado de indivíduos em eterna concorrência. Incapaz de engendrar qualquer forma de solidariedade social, esta noção consumista e individualista de si mesmo é um prato cheio para discursos do culto da força, pois a violência já internalizada pelos indivíduos concorrentes torna-se completamente naturalizada.
Não por outro motivo, Pasolini apontava que o novo fascismo era muito mais perverso que o fascismo histórico. “Estamos todos em perigo!”, dissera ele, nem tanto aos seus contemporâneos, mas a nós, 40 anos depois de seu assassinato. É porque estamos todos em perigo que precisamos vencê-lo. Não apenas pela resistência e uma nova superação eleitoral das forças políticas que encarnam o novo fascismo, pois trata-se mesmo da criação de uma nova forma de vida. Afinal, nunca se pode esquecer que a democracia não é simplesmente uma forma de governo, porém uma forma de vida: talvez a única que se possa dizer plenamente vida.

Fonte: https://outraspalavras.net/brasil/fascismo-teu-novo-nome-e-consumismo/?fbclid=IwAR0esZbuYhm0UnseYmCm7r3jPncFtDTmRH4s9UbpYbjxTc3R6uRF-0Z1vyI

Colaboração: Rafhael Fumagali

quinta-feira, 8 de novembro de 2018

BRASIL








NA NOVA LEI ANTITERRORISMO, SEUS LIKES PODEM LEVAR VOCÊ PARA A CADEIA




8 de Novembro de 2018, 0h03
O SEU LIKE DESCOMPROMISSADO ou o seu compartilhamento engajado podem lhe render uma pesada pena por apoio ou apologia ao terrorismo se uma mudança na Lei Antiterrorismo for aprovada. O projeto está em debate no Congresso e pode ser aprovado nas próximas semanas.
A lei que pode transformar meras curtidas nas redes sociais em crimes contra a pátria nasceu após uma reportagem da revista Veja sobre um recrutador de brasileiros para o Estado Islâmico. Com medo de brasileiros “radicalizarem” e passarem a cometer atos terroristas como os extremistas do Islã, o senador gaúcho Lasier Martins, do PSD, apresentou em julho de 2016 um projeto para endurecer a Lei Antiterrorismo, que havia sido aprovada por Dilma Rousseff três meses antes, pouco antes do impeachment. Para Martins, a proposta sancionada por Rousseff – com muitos vetos – era “inócua”. Era preciso, segundo ele, endurecer a caçada aos terroristas.
Dois anos depois, a proposta, o PLS 272/2016, voltou à pauta – mas o contexto é bem diferente. Seu projeto ganhou novos contornos e, às vésperas do governo de Jair Bolsonaro, é o instrumento que faltava para o governo perseguir e prender opositores – ou “terroristas”, seja lá o que for classificado desta maneira. A lei, na prática, já poderia criminalizar movimentos sociais e manifestações de qualquer tipo, mas, se a nova proposta for aprovada, o cerco ficaria ainda pior.
Apoiado por Bolsonaro, o novo projeto caiu no colo do senador ultraconservador Magno Malta, do PR, aquele mesmo que conduziu a reza da vitória depois do resultado do segundo turno. Sem conseguir se reeleger para o Senado e já buscando preparar o terreno para o novo governo (do qual possivelmente fará parte como ministro), Malta aproveita o período de transição, em que as atenções ainda estão dispersas, para articular a aprovação do projeto às pressas na Comissão de Constituição e Justiça do Senado.

DOC RelatóRio Legislativo SF186322515043 201803215 pages

“A gente sabia que uma hora ele [o projeto de lei] ia efetivamente entrar em votação, esperando um momento favorável”, diz Camila Marques, advogada da Artigo 19, ONG que apoia o acesso à informação. “A eleição de Bolsonaro, que defendeu abertamente a inclusão de movimentos de luta pela moradia, por exemplo, na lista de grupos terroristas, criou exatamente esse momento favorável.”
Lasier Martins e Magno Malta miraram no Estado Islâmico – mas, na prática, podem afetar qualquer pessoa que se opõe ao governo. Entre as mudanças, está definido como terrorismo o ato de “incendiar, depredar, saquear, destruir ou explodir meios de transporte ou qualquer bem público ou privado, com o objetivo de forçar a autoridade pública a praticar ato, abster-se de o praticar”. Este trecho estava no projeto original aprovado em 2016, mas foi vetado por Dilma Rousseff. Outra mudança é a tipificação do ato de “louvar outra pessoa, grupo, organização ou associação pela prática dos crimes previstos” na lei – inclusive na internet. Uma moldura na sua foto de perfil do Facebook, por exemplo, em uma interpretação ampla – mas possível – da lei.

Cuidado com os eventos no Facebook

Como relator, Magno Malta não apenas deu seu parecer favorável ao projeto, como ainda buscou torná-lo pior e mais perigoso a movimentos sociais, com o acréscimo de duas emendas.
A primeira altera o artigo que define o que seria terrorismo. O projeto original dizia que terrorismo é a “prática por um ou mais indivíduos dos atos previstos nesse artigo por razões de xenofobia, discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia ou religião”. Malta acrescentou ao texto “ou por outra motivação política, ideológica ou social”. A manobra mira políticos e que pregam transformação social como o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) e o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST), alvos preferenciais dos ataques do presidente eleito Jair Bolsonaro. Sabe a camiseta ou boné do MST? Então: pode ficar complicado desfilar com ela por aí.
A segunda alteração acrescenta a tipificação de “atos preparatórios” de um suposto ato terrorista. A redação proposta por Malta acrescentaria que “nas mesmas penas incorre aquele que, pessoalmente ou por interposta pessoa, presta auxílio ou abriga pessoa de quem saiba estar praticando atos preparatórios de terrorismo”. Como seria provada a intenção? Seriam usados posts na internet? Escrever, mesmo que de brincadeira, sobre a intenção de matar uma autoridade, incendiar o Congresso ou algo parecido, valeria uma condenação?
Se as sugestões de Malta forem aprovadas, barricadas com fogo, muito comuns em manifestações, poderiam ser consideradas parte de um plano terrorista, e qualquer manifestação popular poderia ser automaticamente enquadrada por suas motivações “política, ideológica ou social” – em especial se a polícia agredisse os manifestantes e os acusasse de reagir ou incitar.

O artigo alterado também trata de quem potencialmente auxilie em tais atos, podendo criminalizar quem meramente tenha contato com o suposto terrorista, como alguém que lhe venda algum material a ser usado em ato terrorista, ou alugue ou empreste uma casa ou um carro, mesmo que não faça ideia das intenções do suposto criminoso.
Mas piora: pode ser que você compartilhe um evento no Facebook, convocando para um protesto, e a manifestação tenha conflito, barricadas e vidraças quebradas. É o suficiente. Não apenas quem estava na manifestação pode ser acusado de participar de um ato terrorista, como quem compartilhou o evento, convocou ou incentivou a participação pode ser enquadrado na Lei Antiterrorismo por prática de “atos preparatórios”. Se você ainda comemorar posteriormente ou celebrar os que conseguiram sair ilesos ou desafiaram a polícia durante o protesto, estará em situação ainda pior – terá praticado “atos preparatórios” e ainda terá louvado “pessoa, grupo, organização ou associação pela prática” do terrorismo.

Um passo para a criminalização dos movimentos sociais

Durante os debates, o senador Randolfe Rodrigues, da Rede, alertou que o objetivo de Martins e Malta seria o de estender qualquer tipo de crime para os movimento sociais. “É um ato de censura, de combate ao direito de ir e vir e à liberdade de manifestação, conceituado na Constituição”, disse Rodrigues. O senador petista Lindbergh Farias classificou o projeto como um violento atentado à democracia. “Em cima desse texto, podem prender militantes de movimentos estudantis, movimentos sindicais, estamos criminalizando o MST”, afirmou.
A oposição pediu uma audiência pública e conseguiu travar, no dia 31 de outubro, a votação na Comissão de Constituição e Justiça no Senado. A intenção é tentar impedir que o projeto seja votado em 2018 – mas Bolsonaro já sinalizou, inúmeras vezes, suas intenções ao lidar com opositores e movimentos sociais, especialmente os que taxa como “esquerdistas”. “Vamos botar um ponto final em todos os ativismos do Brasil”, chegou a dizer, durante um ato na Avenida Paulista uma semana antes de ser eleito presidente.
Em entrevista para a Folha de S.Paulo, a historiadora Maud Chirio, pesquisadora sobre a direita brasileira, deu voz às preocupações dos movimentos: “Para mim, no dia 3 de janeiro de 2019 [dois dias após a posse de Bolsonaro], o MST e o MTST serão declarados organizações terroristas“. Com as modificações, este não seria um cenário difícil de se concretizar. De olho em um espaço no futuro governo, Malta faz o que pode para garantir um emprego em 2019.

Herança do PT

Embora nunca tenha sido usada para criminalizar movimentos sociais, a Lei Antiterrorismo é um legado da gestão de Dilma Rousseff, na época preocupada com os protestos que ocorriam no Brasil em junho de 2013 e em possíveis manifestações que poderiam bagunçar a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016.
O Brasil mal havia tido tempo de respirar após os grandes protestos de junho de 2013 quando, em novembro daquele mesmo ano, a comissão mista da Consolidação das Leis e Regulamentação da Constituição do Senado, presidida pelo senador Romero Jucá, do MDB, e pelo deputado federal petista Candido Vaccarezza, apresentou o Projeto de Lei do Senado 499/2013.

Nascia ali o embrião do projeto da Lei Antiterrorismo. O PL tipificava, já em seu primeiro artigo, o terrorismo como “o ato de provocar ou infundir terror ou pânico generalizado mediante ofensa à vida, à integridade física, à saúde ou à previsão de liberdade de pessoa”. O objetivo da lei era atualizar a antiga Lei de Segurança Nacional, aprovada durante a ditadura, e que seria insuficiente para lidar com o tema específico e cada vez mais discutido do terrorismo (como consta na justificativa do próprio projeto).
O país ainda tentava entender o que havia acontecido nos últimos meses de revolta social, mas os poderes da república estavam mais preocupados em garantir que junho nunca mais acontecesse – e, se acontecesse, que fosse ainda mais duramente criminalizado e reprimido. E 2014 era ano de Copa e logo depois, em 2016, viriam os Jogos Olímpicos – era importante, naquele contexto, impedir protestos que pudessem se tornar violentos.
proposta foi criticada pela OAB, que considerava não haver “justificativa para que se promova a tipificação da conduta em lei específica” e contra movimentos sociais. Mas a nova lei foi desde o princípio apoiada por políticos da oposição e do governo. Se por um lado o então ministro dos esportes, Aldo Rebelo, do PCdoB, comentava que o que mais preocupava às vésperas da Copa de 2014 eram os crimes comuns e não o terrorismo, por outro, senadores do PT como Jorge Viana e Paulo Paim, defendiam a votação urgente do projeto.
O deputado petista Humberto Costa fazia uma oposição solitária à proposta. Declarou, na época, que “tem que ficar absolutamente claro que terrorismo é aquilo que representa, de fato, uma ameaça ao Estado, e ao regime democrático que leve a uma risco de ruptura. Não podemos pegar as manifestações sociais e classificar como o terrorismo”.
Passou a Copa do Mundo, e o texto seguia parado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado em 2015. Quase ao mesmo tempo, no entanto, o governo apresentou na Câmara dos Deputados outro projeto, que alterou a Lei das Organizações Criminosas, e tipificou o crime de terrorismo, prevendo as penas mais pesadas de 15 até 30 anos em regime fechado.
O governo dizia que levou adiante a lei atendendo às cobranças do Grupo de Ação Financeira contra a Lavagem de Dinheiro e o Financiamento do Terrorismo, uma organização intergovernamental formada por 36 países, incluindo o Brasil, que exigiu uma tipificação para o crime de terrorismo. Especialistas, no entanto, viram a proposta como uma forma do governo federal ampliar o estado policial, que já estava em curso com a criação da Força Nacional de Segurança (pelo então presidente Lula em 2004) e a ocupação de favelas (como Maré e Alemão) pelo Exército.
O projeto passou como um relâmpago pela Câmara e Senado e se tornou lei em março de 2016, quando foi sancionado por Dilma Rousseff – a tempo das Olimpíadas do Rio de Janeiro. Rousseff vetou alguns dos artigos mais polêmicos, como o que considerava como atos de terror “incendiar, depredar, saquear, destruir ou explodir meios de transporte ou qualquer bem público ou privado” ou ações de “interferir, sabotar ou danificar sistemas de informática ou bancos de dados”, além da “apologia ao terrorismo”.


‘As disposições do projeto por si só não garantem que essa lei não seja usada contra manifestantes e defensores de direitos humanos.’

Apesar disso, ativistas especialistas ligados ao Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos apontaram para o perigo que a lei representava pela sua mera existência e a possibilidade de servir de base para futuras perseguições políticas.“As disposições do projeto por si só não garantem que essa lei não seja usada contra manifestantes e defensores de direitos humanos”, disse o representante da ONU Amerigo Incalcaterra. Eles apontaram esse cenário caso houvesse uma maioria capaz de alterar o texto e passar por cima dos vetos da então presidente – ou mesmo uma interpretação da lei pelas autoridades que levasse à criminalização de movimentos sociais e protestos, como alertou Guilherme Boulos na época. Dito e feito.
Imediatamente após a aprovação da lei, em 21 de julho, 15 suspeitos foram presos no Rio de Janeiro acusados de planejar um atentado terrorista durante as Olimpíadas em uma operação até hoje envolta em dúvidas e controvérsia. Oito foram condenados.
Na tentativa de obter total controle sobre as ruas após 2013 com a emergência de novos movimentos autônomos e descentralizados apostando no uso pesado de redes sociais, o PT de Dilma e Lula buscou formas de garantir sua segurança institucional com a certeza de que se perpetuaria no poder. O apoio de partidos aliados à direita (e mesmo opositores) não foi uma surpresa – era do interesse de diversas esferas do poder a aprovação de uma lei que limitasse protestos.
Mas a manobra poderá custar muito caro à esquerda e mesmo à população em geral, que passou a tomar gosto por sair às ruas em protestos independentemente do espectro político. “Somente uma resistência articulada é capaz de barrar os retrocessos e esses instrumentos de repressão e criminalização”, diz Camila Marques.

Fonte: https://theintercept.com/2018/11/07/lei-antiterrorismo/?fbclid=IwAR2JuZ9b1dSgqt_jSzw9h4BMgZInMTlj6aL723sOYDNX8FxrDTPz3N_aF3A

domingo, 4 de novembro de 2018

CINEMA


‘O Estado cria a ilusão de que, se você é pobre, a culpa é sua’ – Ken Loach



O filme Eu, Daniel Blake, é a história de um homem bom abandonado por um sistema mau. Um trabalhador honrado sofre um ataque do coração que o condena ao repouso. Sem renda, solicita apoio do Estado e se vê enroscado em uma cruel espiral burocrática. Esperas absurdas ao telefone, entrevistas humilhantes, formulários estúpidos, funcionários desprovidos de empatia por causa do sistema. Kafka nos anos de austeridade. Nessa espiral desumanizadora Daniel encontra Katie, mãe solteira de dois filhos, obrigada a se mudar para Newcastle porque o sistema diz que não há lugar para alojá-los em Londres, uma cidade com 10.000 moradias vazias. Daniel se torna um pai para Katie e um avô para as crianças. A humanidade que demonstram realça a indignidade do monstro que os condena. Aí está, como terão reconhecido seus fiéis, o toque de Ken Loach.
Seu cinema sempre esteve do lado dos menos favorecidos e, aos 80 anos, a realidade continua lhe dando argumentos para permanecer atrás das câmeras. Eu, Daniel Blake, Palma de Ouro no último festival de Cannes (a segunda de Loach), é um filme espartano. Não precisa de piruetas para comover. A história foi escrita pelo amigo e roteirista Paul Laverty, depois de percorrer bancos de alimentos, centros de emprego e outros cenários trágicos do Reino Unido de hoje, onde conheceu muitos daniels e katies. A realidade de Loach (Nuneaton, 1936) está lá fora para quem quiser vê-la. Mas, em um mundo imune aos dados, a emoção que o cineasta mobiliza para contar essa realidade se revela mais valiosa que nunca. Recebe o El País em seu escritório no Soho londrino.
Como chegamos à situação que seu filme descreve?
É um processo inevitável, é a forma como o capitalismo se desenvolveu. As grandes corporações dominam a economia e isso cria uma grande leva de pessoas pobres. O Estado deve apoiá-las, mas não quer ou não tem recursos. Por isso cria a ilusão de que, se você é pobre, a culpa é sua. Porque você não preencheu seu currículo direito ou chegou tarde a uma entrevista. Montam um sistema burocrático que te pune por ser pobre. A humilhação é um elemento-chave na pobreza. Rouba a sua dignidade e a sua autoestima. E o Estado contribui para a humilhação com toda essa burocracia estúpida.
Abandonar os mais desfavorecidos é uma escolha política?
É uma escolha política nascida das demandas do capital. Se os pobres não aceitassem que a pobreza é sua culpa, poderia haver um movimento para desafiar o sistema econômico. Os meios de comunicação falam de gente folgada, de viciados, de pessoas que têm muitos filhos, que compram televisores grandes… Sempre encontram histórias para culpar os pobres ou os migrantes. É uma forma de demonizar a pobreza. Neste inverno, muitas famílias terão de escolher entre comer e se esquentar. Existe uma determinação da direita para não falar dessas coisas e é assustador tolerarmos isso.
A situação lembra Cathy Come Home, seu filme de 1966 sobre uma família jovem que está na rua. O que mudou em 50 anos?
Agora é pior. Naquela época, os elementos do Estado de bem-estar ainda funcionavam, agora não. A sociedade, hoje, não está tão coesa. Acontece em toda a Europa. O sistema se tornou pior porque o processo capitalista avança.
As histórias humanas são seu veículo para articular mensagens políticas?
Todas as histórias humanas são políticas. Têm consequências políticas. Nem Katie nem Dan são animais políticos. Não fazem discursos, não participam de reuniões. Mas a situação em que se encontram é determinada pela política. É preciso haver indivíduos. Não vale alguém que represente algo. Devem ser idiossincrásicos. Devem ser pessoas com coisas particulares que as tornem especiais.
Todo o cinema é político?
O cinema norte-americano cultua a riqueza. Os personagens têm dinheiro e casas bonitas. E nunca se explica de onde vem esse dinheiro. Todos parecem muito saudáveis, têm corpos perfeitos. O subtexto é que a riqueza é boa, que o privilégio é bom. Além de outras mensagens, como que o homem com um revólver resolverá todos os seus problemas. Há uma agenda de direita no cinema norte-americano. Com exceção de Chaplin, claro. Seus filmes contêm uma certa política radical, a do homem pequeno que vence.
Você apoia Jeremy Corbyn, o polêmico líder trabalhista. Acredita que seu projeto de esquerda poderia mudar a realidade descrita em seu filme?
Sim, sou otimista. Sanders, Podemos, Syriza… Existe uma sensação de que outro mundo é possível. A ascensão de Corbyn traz muita esperança, mas é sistematicamente atacada por toda a imprensa, pela BBC, e até pelos jornais de esquerda. É uma grande batalha, mas é muito popular entre as bases.
Acontece com frequência, como seu país demonstrou, que as mensagens populistas e xenófobas atraiam os mais desfavorecidos.
Oferecem uma resposta simples: os imigrantes roubaram seu trabalho. É igual ao crescimento do fascismo nos anos 1930. É fácil apontar o diferente. As pessoas são sempre vulneráveis às respostas simples. A esquerda tem uma resposta mais complicada.
O que pensa quando ouve Theresa May dizer que os conservadores são o partido da classe trabalhadora?
Seria uma piada, não fosse o fato de que ninguém a questiona. É um Governo que utiliza a fome como arma, que deixa as pessoas passarem fome para discipliná-las. É propaganda.
Insinuou que Jimmy’s Hall (2014) seria seu último filme, mas voltou e ganhou a Palma de Ouro. Desta vez é para valer?
Não sei. Como no futebol, jogaremos uma partida de cada vez. Há muitas histórias para contar, mas, fisicamente, o cinema é muito exigente.
Como gostaria de ser lembrado?
Como alguém que não se rendeu, acho. Não se render é importante, porque a luta continua. E as pessoas tendem a se render quando ficam velhas.

AGROECOLOGIA




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Brasil de Fato | Curitiba (PR)
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