O Que É Possível? Entrevista Com Lala Deheinzelin
Com background nas artes cênicas, cinema
e televisão é uma das pioneiras da economia criativa no Brasil. Seu
trabalho atual é realizar palestras,oficinas e consultorias, em países
de quatro continentes, sobre como aplicar em desenvolvimento local,
nacional e empresarial a sistematização que desenvolveu numa rara
combinação de economia criativa, sustentabilidade e processos
colaborativos em rede . Sua atuação transdisciplinar, depois de iniciada
no setor cultural, se expande na ação com empresas, terceiro setor,
governos e instituições de fomento, organismos multilaterais e redes
colaborativas. É proprietária da
Enthusiasmo Cultural e criadora do movimento
Crie Futuros.
Uma das fundadoras do Núcleo de Estudos
do Futuro da PUC, parte do Millenium Project das Nações Unidas. Membro
do Conselho do Instituto Nacional de Moda e Design/ Calendário Oficial
da Moda Brasileira. Assessora Sénior da Special Unit On South-South
Cooperation , ONU, 2005/2011.
Publicações:
Desejável Mundo Novo
(2012); capítulo em Economia Criativa – um conjunto de visões ( 2012) ;
capítulo em Sustentar a Vida (2011); coordenadora e coautora de
Economia Criativa e Desenvolvimento Local (2010); prefácio de Creative
Monetary Evaluation (2009); Introdução ao Compêndio de Indicadores de
Sustentabilidade de Nações (2008); uma das organizadoras dos quatro
volumes de Economia Criativa, publicados pelo IN- MOD/São Paulo Fashion
Week (2007-2010)além de artigos em publicações de cultura,
sustentabilidade e desenvolvimento em âmbito iberoamericano.
Mirla Ferreira:
Lala, o seu trabalho mostra porque a Economia Criativa é estratégica no
século XXI, nos mostra as oportunidades que oferece, assim como, as
condições necessárias para seu florescimento. Pode-nos explicar em que
consiste essa Economia Criativa?
Lala Deheinzelin:
Economia criativa é um termo bastante novo, e que na verdade não é nada
que foi criado recentemente, más é a junção de tudo o que existe como
atividade económica e que trabalha com criatividade e cultura como
matéria-prima. Todas essas actividades têm coisas em comum, precisam de
um ambiente semelhante, e precisam do mesmo tipo de estímulo para
formulação de políticas, então a ideia de economia criativa é agrupar
tudo isso como um setor para poder formular políticas para isso.
Com a perspectiva de sustentabilidade percebemos a economia criativa,
não como sendo uma das estratégias do século XXI senão “a grande
estratégia”. Estamos a falar de um recurso que é a criatividade e a
cultura, que é absolutamente abundante nos países e é um recurso mágico…
mágico porque?… Porque quanto mais usa, mais tem. E o que tem de genial
é que é uma atividade económica que não se desenrola unicamente na
dimensão económica, ela tem contacto com as outras três dimensões que
fazem parte da nossa vida, a simbólica, a social, e a ambiental, quando
você trabalha com isso, você consegue transformar isso tudo … por isso é
que ela é tão poderosa, porque na verdade, você consegue através de
algo que as pessoas fazem, mudar todo o entorno.
Economia Criativa é uma economia baseada em recursos intangíveis,
que, além de cultura, conhecimento e criatividade, engloba os ativos
intangíveis, a experiência, a diversidade cultural. Tudo aquilo que
qualifica e diferencia pessoas, empreendimentos, comunidades, projetos.
Mirla Ferreira:
Sabemos que é por meio do trabalho que a pessoa alcança o progresso
pelo qual anela, desde o bem-estar material até ao desenvolvimento da
inteligência. Neste momento de crise, onde o desemprego se alastra como
uma doença perigosa da sociedade, criando miséria. Qual seria a postura
mais saudável, dentro do conceito de economia criativa sustentável, que
poderiam adoptar os empresários para criar um futuro promissor?
Lala Deheinzelin:
Temos recursos naturais, culturais e humanos incomparáveis.. as nossas
lideranças não têm consciência ainda do valor que isso tem…
Nós somos, porém não estamos ricos … Existe
aí uma diferença muito grande entre o ser e o estar. “Porque nós não
estamos ricos?” … Porque a gente não da valor e não investe naquilo que
nos é mais precioso. Vivemos a passagem de séculos em que sociedade,
economia e política, se organizam em torno dos recursos materiais, como
terra, ouro ou petróleo, que por serem
tangíveis se consomem com o uso e são finitos.
E essa finitude cria uma economia da escassez baseada em modelos de
competição. Porém, os recursos intangíveis como cultura, conhecimento,
experiência são
infinitos,
renováveis, e podem apresentar uma
economia de abundância, baseada em
modelos de colaboração.
Hoje em dia tudo o que intangível vale mais do que é tangível, por
exemplo, a marca da Coca-Cola vale mais do que a Coca-Cola, vivemos num
momento em que os produtos e serviços se assemelham .. o que é que te
distingue?.. é a tua cultura, inclusive como empresa. Não existe mais,
numa visão de futuro, uma sobrevivência empresarial sem valores no
sentido mais amplo, o seu valor económico vai diminuir se os seus
valores éticos não crescerem, e isso está cada vez mais claro.
Mirla Ferreira:
E a postura indivíduo? aquele que se encontra à procura de trabalho e
que simplesmente não encontra uma oportunidade, perdendo a sua
auto-estima dia após dia.
Lala Deheinzelin:
A economia criativa depende de duas questões chaves para poder se
desenvolver: a primeira é a auto-estima, sem a auto-estima não consegue
reconhecer que aquilo que faz tem valor. Aumentar a auto-estima é
fundamental.. A outra coisa que é chave é a questão da confiança, e a
confiança não existe se não existe auto-estima, porque se você não
acredita em você .. você não acredita no outro.. e sem estas duas coisas
você também não consegue a ética… e a ética é fundamental, já vimos que
o seu valor económico vai diminuir se os seus valores éticos não
crescerem.
Mirla Ferreira:
Eu acredito no futuro promissor do mundo empresarial. Vem-me a memória
uma frase de Thomas Carlyle, “De nada serve ao homem queixar-se dos
tempos em que vive. A única coisa boa que pode fazer é tentar
melhorá-los”. Como é para Lala Deheinzelin o futuro empresarial?
Lala Deheinzelin:
A Economia Criativa pode ser uma chave para a sustentabilidade e para
um futuro promissor no mundo empresarial, um lugar onde possamos
trabalhar com bem-estar. Neste tipo de economia a gente percebe que
existem 4 pilares, que são infinitos.
O primeiro desses pilares é o dos intangíveis, infinito, são
infinitos porque não se consomem mas se multiplicam com o uso. O segundo
dos pilares, que é outro infinito, é das novas tecnologias, porque você
tem um mundo real e muitos mundos virtuais, e a través da tecnologia
você potencializa e tem como trabalhar esses intangíveis, Quando se
junta esse pilar dos intangíveis com o pilar das novas tecnologias, você
gera um terceiro pilar que também é infinito, e que é o mais fascinante
de todos, que é o do colaborativo. Existe todo um universo, existe uma
nova tendência de economia colaborativa que é fantástica, que são todas
as maneiras de trabalhar junto.. a gente olha e fala….. ah ah tudo
bacana …seriamos felizes. Qual é o grande problema? .. É que tudo isso
está invisível, porque as nossas réguas, todo o jeito que tem de medir,
de dar valor, de comparar, de ver evidencias, são feitas para o
financeiro, quantitativo e numérico. Então esses três infinitos estão
como se fossem invisíveis. A questão toda é .. como é que a gente
desenvolve outras métricas, outras moedas, outros indicadores? este é o 4
pilar, é uma visão multidimensional de riqueza, novas moedas e
indicadores. É o desafio para o qual trabalho constantemente…
Recomendado por Wilson João Zonin
by
Mirla Ferreira | 9th April 2013
Fonte: http://emete.com/blog/20130409/economia-criativa-e-o-futuro-que-queremos-construir-o-que-e-possivel-entrevista-com-lala-deheinzelin/