quarta-feira, 24 de julho de 2013

BIODIGESTORES


 


Minimizando séculos de passivos ambientais

 

 A implantação de biodigestores em propriedades rurais e indústrias no Brasil tem, ainda, um enfoque muito mais econômico que ambiental. Especialistas afirmam, inclusive, que a tecnologia pode solucionar também boa parte dos problemas de saneamento no Brasil, como o tratamento de esgoto sanitário.


Tecnologias que reduzem impactos ambientais  

A notória má gestão dos resíduos da criação de aves e suínos, principalmente, e, em menor proporção de gado leiteiro, ou pouco evoluída no tratamento de efluentes das indústrias de alimento, gerou, e ainda vem gerando, um enorme passivo ambiental. Mas nas últimas décadas, e aos poucos, algumas empresas têm se especializado em tratar os efluentes oriundos da agropecuária e das indústrias de alimentos.

Tecnologia que reduz impactos ambientais 

De que serve a tecnologia senão para minimizarmos o impacto da nossa existência sobre o planeta. Diversas empresas, muitas delas “incubadas” através de convênios entre universidades e centros ou parques tecnológicos, vêm ocupando um mercado criado pela atual legislação brasileira e pela crescente conscientização ambiental, fatos que tem levado algumas indústrias a desenvolver atividades no sentido de quantificar a vazão e determinar a composição dos seus efluentes. Entretanto, apesar do evidente ganho ambiental que tais iniciativas propiciam a todos os seres vivos, o grande motivo para a atual “febre” da construção de biodigestores, principalmente os que processam dejetos industriais, é financeira mesmo. Em pouco tempo o investimento é coberto pela economia de recursos como lenha, por exemplo.

Segundo dados obtidos no site de uma das empresas que atua na construção e manutenção de biodigestores industriais e agropecuários, com clientes em vários estados do Brasil (veja Box), somente uma fecularia atendida pela empresa no município de Terra Roxa, está tendo 70% do cavaco poupado e 25.000 toneladas equivalentes em CO2 evitadas ao ano com o uso do biogás.
Nas granjas produtoras de suínos e aves, e, nas pequenas propriedades produtoras de leite, os ganhos também são evidentes, embora na indústria eles sejam muito mais consideráveis no aspecto econômico. 

Granja Miotto, em Palotina/Pr
No mundo, China e Costa Rica são os grandes destaques no tratamento de efluentes das indústrias de alimentos através da biodigestão, com produção de biogás para geração de energia elétrica e térmica. Mas há experiências exitosas no mundo todo com dejetos de animais e da agricultura na Europa e no Oriente Médio, e, também de dejetos das cidades nos EUA e África.



Como funciona


Fecularia Lopes - Icaraíma/Pr


O biodigestor anaeróbico é um equipamento usado para o processamento de matéria orgânica, seja de fezes e urina, entranhas de animais descartadas em frigoríficos e sobras vegetais da produção agrícola. Ele funciona como um reator químico, onde as reações acontecem de forma biológica, ou seja, são realizadas por bactérias que digerem matéria orgânica em condições anaeróbias (ausência de oxigênio).
Os biodigestores permitem que o dejeto seja tratado e transformado em biogás, utilizado para a produção de energia e biofertilizante. Além da economia, de energia e biofertilizantes, a tecnologia impede que os dejetos de animais sejam jogados no meio ambiente sem tratamento, contaminando nascentes e lençóis freáticos. Assim, o uso dos biodigestores evita a poluição do meio ambiente com os dejetos orgânicos, especialmente das águas, que tradicionalmente são o seu principal destino, mas também do solo, pois entre outras coisas, reduz significativamente o espaço utilizado para seu tratamento, se levarmos em consideração outros métodos, como as lagoas facultativas, por exemplo.
O digestor anaeróbio produz dois produtos. O biogás, que é uma mistura de gases – cerca de 75% de metano e 25% de CO2 e fertilizantes de ótima qualidade, bem melhores que os químicos, muitas vezes líquidos, misturados à água, mas em alguns processos também sólidos.
A captura do gás metano gera créditos de carbono, com valor de mercado entre os países desenvolvidos e mais poluidores do planeta. Mas a maior parte das pesquisas sobre biodigestores ainda se relaciona à agropecuária, à criação de aves e suínos. 



Empresas


Há, no mercado, empresas atuando na implantação de kits prontos de pequenos biodigestores, verticais ou de lona, para pequenas propriedades e, também na construção de biodigestores gigantes, utilizando-se da mesma técnica. As facilidades de financiamento através de programas como o Pronaf Eco e Programa ABC garantem de 100% do valor financiado com prazos e carência atrativos.

Desta forma encontram-se a venda biodigestores de 10 metros cúbicos e menos de 10 metros quadrados, com produção média de 3 a 5m³ de biogás por dia ou 5 botijões de 13 quilos por mês, e, com uma expectativa de produção de biofertilizantes na faixa de 60 quilos de uréia, 60 quilos de super triplo e 25 quilos de cloreto de potássio. É um sistema destinado a pequenas propriedades e atende cerca de 50 suínos com peso médio de 70 quilos ou 10 bovinos com peso médio de 400 quilos.
O kit básico para instalação e uso do biogás fornecido por uma destas indústrias é composto do kit de instalação (tubulação de biogás, conexões e manômetro), medidor de produção de biogás, bomba de sucção do biogás, purificador de 4 Litros, fogão de duas bocas especial para biogás, balão de armazenamento do biogás de 2 m³ e biodigestor de 10 m³. 
Há também os gigantes, como os construídos por uma empresa do Oeste Paranaense que projeta e executa obras na área de tratamento biológico de efluentes industriais, com objetivo principal de recuperar biogás para geração de energia térmica e elétrica. Aí a produção de biogás é exponencialmente maior. Para se ter uma ideia do número de indústrias que tem investido neste setor a empresa, que não é única na área, tem cerca de duas dezenas de obras previstas para 2013.



Tido como um dos maiores do mundo, o biodigestor construído pela empresa no município de Guaíra, também no oeste do Paraná, tem cerca de 10 mil metros quadrados e está proporcionando uma redução de emissão de aproximada de 30.000 toneladas de CO2 equivalente e redução em 80% no consumo de lenha.

“É claro que nem todas as obras são deste porte. Há os biodigestores construídos em granjas, por exemplo, cuja capacidade pode girar em torno de 1.200m³”, esclarece Eduardo Ferreira, engenheiro agrônomo e sócio da empresa. 




Uma experiência modelo




Algumas iniciativas, como o Condomínio de Agroenergia para Agricultura Familiar da Microbacia do Rio Ajuricaba, foram implantados com apoio oficial de empresas de geração de energia, como a Itaipu Binacional e sua Plataforma de Energias Renováveis. A localidade de Linha Ajuricaba fica no interior do município de Marechal Cândido Rondon, oeste paranaense. É composta quase que totalmente por pequenas propriedades, a maioria produtoras de leite e fica às margens do reservatório da usina de Itapu.

Os passivos ambientais decorrentes de cinco décadas de uso da terra e nenhuma preocupação com os dejetos das atividades agropecuárias começaram a ser corrigidos por volta de 2005 dentro das atividades propostas pelas iniciativas previstas pela Itaipu Binacional para a Bacia do Paraná III, através do Programa Cultivando Água Boa.

Em 2009 iniciou-se a implantação do Condomínio de Agroenergia, nos moldes dos desenvolvidos na Alemanha, através de uma parceria entre o Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-PR), Companhia Paranaense de Energia (Copel) Prefeitura Municipal de Marechal Cândido Rondon, Embrapa, Movimento Nacional dos Pequenos Agricultores (MPA), Instituto de Tecnologia Aplicada e Inovação (ITAI) e a Fundação Parque Tecnológico Itaipu (FPTI) e os próprios produtores.

O objetivo do projeto foi implantar uma referência concreta para a agroenergia na agricultura familiar e desenvolver os critérios para sua sustentação econômica, ambiental, social  e energética.  O projeto contempla a instalação de 34 biodigestores e 22 km de gasodutos ligados a uma microcentral termelétrica.

Entretanto, por ora nem todos os produtores integrados instalaram os equipamentos para a utilização do biogás em suas propriedades, principalmente em função dos custos que podem chegar a R$ 800,00. Da mesma forma, ainda não comercializam assim o excedente para a Companhia de Energia do Estado. 


Biodigestores para tratar esgoto sanitário das cidades

O biodigestor é uma tecnologia simples e de baixo custo para tratar dejetos orgânicos, incluindo esgoto. Para Moacir Araújo, especialista em engenharia hidráulica e saneamento, o Brasil erra ao buscar uma solução de universalização do tratamento do esgoto através da construção de grandes estações de tratamento e redes coletoras. Para ele, isto é um equívoco, já que o custo é extremamente elevado, estimado em R$ 150 bilhões, não previstos, por enquanto, no orçamento público.Segundo ele afirma em entrevista ao site de jornalismo e sustentabilidade Envolverde (http://envolverde.com.br/sociedade/brasil-sociedade/biodigestor-pode-solucionar-parte-do-problema-de-saneamento-basico-no-brasil), “para um país onde 95% dos municípios são pequenos, com população de até cem mil habitantes, existem alternativas melhores. Uma delas, que eu chamo de ganha-ganha, é o biodigestor.”

De acordo com ele, a tecnologia conta com o apoio do Ministério das Cidades, mas não há levantamentos sobre quais e quantos municípios adotam esse tipo de solução. Moacir Araújo conta ainda que as pesquisas desenvolvidas, por exemplo, pela Escola de Engenharia da USP de São Carlos, e por algumas empresas da área, recebem reconhecimento internacional. “As pesquisas e as aplicações têm demonstrado tecnologias eficazes para tratamento do esgoto sanitário por meio do biodigestor e, ainda, no fim do processo, com a oportunidade de gerar energia”, explica Araújo. 
Uma alternativa para o uso do biogás resultante do tratamento de efluentes urbanos é o seu emprego para a secagem do próprio lodo oriundo do tratamento. O gás proveniente da operação de um digestor tipo UASB (sigla inglesa que denomina os reatores anaeróbios de fluxo ascendente através de uma manta de lodo), seria suficiente para a secagem do excesso de lodo produzido pelo mesmo, conforme demonstram vários estudos de viabilidade. O resultado seriam plantas de tratamento mais compactas: um reator como estes, de fluxo rápido e retenção eficiente dos agentes biológicos, proporciona bons resultados na redução da carga orgânica com tempos de detenção muito curtos, necessitando de área útil bastante inferior à dos modelos horizontais; o emprego do metano evitaria o dispêndio de espaço com leitos de secagem convencionais.



 



 

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