Minimizando séculos de passivos ambientais
A implantação de biodigestores em propriedades rurais e indústrias no Brasil tem, ainda, um enfoque muito mais econômico que ambiental. Especialistas afirmam, inclusive, que a tecnologia pode solucionar também boa parte dos problemas de saneamento no Brasil, como o tratamento de esgoto sanitário.
Tecnologias que reduzem impactos ambientais
|
A notória má gestão dos resíduos da criação de aves e
suínos, principalmente, e, em menor proporção de gado leiteiro, ou pouco
evoluída no tratamento de efluentes das indústrias de alimento, gerou, e ainda vem
gerando, um enorme passivo ambiental. Mas nas últimas décadas, e aos poucos,
algumas empresas têm se especializado em tratar os efluentes oriundos da
agropecuária e das indústrias de alimentos.
Tecnologia que reduz impactos ambientais
De que serve a tecnologia senão para minimizarmos o impacto
da nossa existência sobre o planeta. Diversas empresas, muitas delas
“incubadas” através de convênios entre universidades e centros ou parques
tecnológicos, vêm ocupando um mercado criado pela atual legislação brasileira e
pela crescente conscientização ambiental, fatos que tem levado algumas
indústrias a desenvolver atividades no sentido de quantificar a vazão e
determinar a composição dos seus efluentes. Entretanto, apesar do evidente
ganho ambiental que tais iniciativas propiciam a todos os seres vivos, o grande
motivo para a atual “febre” da construção de biodigestores, principalmente os que
processam dejetos industriais, é financeira mesmo. Em pouco tempo o investimento
é coberto pela economia de recursos como lenha, por exemplo.
Segundo dados obtidos no site de uma das empresas que atua
na construção e manutenção de biodigestores industriais e agropecuários, com
clientes em vários estados do Brasil (veja Box), somente uma fecularia atendida
pela empresa no município de Terra Roxa, está tendo 70%
do cavaco poupado e 25.000 toneladas equivalentes em CO2 evitadas ao ano com o
uso do biogás.
Nas granjas produtoras de suínos e aves, e, nas pequenas
propriedades produtoras de leite, os ganhos também são evidentes, embora na
indústria eles sejam muito mais consideráveis no aspecto econômico.
Granja Miotto, em Palotina/Pr |
No mundo, China e Costa Rica são os
grandes destaques no tratamento de efluentes das indústrias de alimentos
através da biodigestão, com produção de biogás para geração de energia elétrica
e térmica. Mas há experiências exitosas no mundo todo com dejetos de animais e
da agricultura na Europa e no Oriente Médio, e, também de dejetos das cidades
nos EUA e África.
Como funciona
O biodigestor anaeróbico é um equipamento usado para o
processamento de matéria orgânica, seja de fezes e urina, entranhas de animais
descartadas em frigoríficos e sobras vegetais da produção agrícola. Ele
funciona como um reator químico, onde as reações acontecem de forma biológica,
ou seja, são realizadas por bactérias que digerem matéria orgânica em condições
anaeróbias (ausência de oxigênio).
Os
biodigestores permitem que o dejeto seja tratado e transformado em biogás,
utilizado para a produção de energia e biofertilizante. Além da economia, de
energia e biofertilizantes, a tecnologia impede que os dejetos de animais sejam
jogados no meio ambiente sem tratamento, contaminando nascentes e lençóis
freáticos. Assim, o uso dos biodigestores evita a poluição do meio ambiente com
os dejetos orgânicos, especialmente das águas, que tradicionalmente são o seu
principal destino, mas também do solo, pois entre outras coisas, reduz
significativamente o espaço utilizado para seu tratamento, se levarmos em
consideração outros métodos, como as lagoas facultativas, por exemplo.
O digestor anaeróbio produz dois produtos. O biogás, que é uma mistura de
gases – cerca de 75% de metano e 25% de CO2 e fertilizantes de ótima qualidade,
bem melhores que os químicos, muitas vezes líquidos, misturados à água, mas em
alguns processos também sólidos.
A captura do gás metano gera créditos de carbono, com valor
de mercado entre os países desenvolvidos e mais poluidores do planeta. Mas a
maior parte das pesquisas sobre biodigestores ainda se relaciona à
agropecuária, à criação de aves e suínos.
Empresas
Há, no mercado, empresas atuando na implantação de kits prontos de pequenos
biodigestores, verticais ou de lona, para pequenas propriedades e, também na
construção de biodigestores gigantes, utilizando-se da
mesma técnica. As facilidades de financiamento através de programas como
o Pronaf Eco e Programa ABC garantem de 100% do valor
financiado com prazos e carência atrativos.
Desta forma encontram-se a venda biodigestores de 10 metros cúbicos e menos
de 10 metros quadrados, com produção média de 3 a 5m³ de biogás por dia ou 5
botijões de 13 quilos por mês, e, com uma expectativa de produção de biofertilizantes na faixa de 60 quilos
de uréia, 60 quilos de super triplo e 25 quilos de cloreto de potássio. É um
sistema destinado a pequenas propriedades e atende cerca de 50 suínos com peso
médio de 70 quilos ou 10 bovinos com peso médio de 400 quilos.
O kit básico para instalação e uso do biogás fornecido
por uma destas indústrias é composto do kit de instalação (tubulação de biogás,
conexões e manômetro), medidor de produção de biogás, bomba de sucção do
biogás, purificador de 4 Litros, fogão de duas bocas especial para biogás,
balão de armazenamento do biogás de 2 m³ e biodigestor de 10 m³.
Há também os gigantes, como os construídos por uma
empresa do Oeste Paranaense que projeta e executa obras
na área de tratamento biológico de efluentes industriais, com objetivo
principal de recuperar biogás para geração de energia térmica e elétrica. Aí a produção de biogás é
exponencialmente maior. Para se ter uma ideia do
número de indústrias que tem investido neste setor a empresa, que não é única
na área, tem cerca de duas dezenas de obras previstas para 2013.
Tido como um dos maiores do mundo, o biodigestor
construído pela empresa no município de Guaíra, também no oeste do Paraná, tem
cerca de 10 mil metros quadrados e está proporcionando uma
redução de emissão de aproximada de 30.000 toneladas de CO2 equivalente e
redução em 80% no consumo de lenha.
“É claro que nem todas as obras são
deste porte. Há os biodigestores construídos em granjas, por exemplo, cuja
capacidade pode girar em torno de 1.200m³”, esclarece Eduardo Ferreira,
engenheiro agrônomo e sócio da empresa.
Uma experiência modelo
Algumas iniciativas, como o Condomínio de Agroenergia para Agricultura
Familiar da Microbacia do Rio Ajuricaba, foram implantados com apoio oficial de
empresas de geração de energia, como a Itaipu Binacional e sua Plataforma de
Energias Renováveis. A localidade de Linha Ajuricaba fica no interior do
município de Marechal Cândido Rondon, oeste paranaense. É composta quase que
totalmente por pequenas propriedades, a maioria produtoras de leite e fica às
margens do reservatório da usina de Itapu.
Os passivos ambientais decorrentes de cinco décadas de uso
da terra e nenhuma preocupação com os dejetos das atividades agropecuárias
começaram a ser corrigidos por volta de 2005 dentro das atividades propostas
pelas iniciativas previstas pela Itaipu Binacional para a Bacia do Paraná III,
através do Programa Cultivando Água Boa.
Em 2009 iniciou-se a implantação do Condomínio de Agroenergia,
nos moldes dos desenvolvidos na Alemanha, através de uma parceria entre o
Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-PR),
Companhia Paranaense de Energia (Copel) Prefeitura Municipal de Marechal
Cândido Rondon, Embrapa, Movimento Nacional dos Pequenos Agricultores (MPA),
Instituto de Tecnologia Aplicada e Inovação (ITAI) e a Fundação Parque
Tecnológico Itaipu (FPTI) e os próprios produtores.
O objetivo do projeto foi implantar uma referência
concreta para a agroenergia na agricultura familiar e desenvolver os critérios
para sua sustentação econômica, ambiental, social e energética. O
projeto contempla a instalação de 34 biodigestores e 22 km de gasodutos ligados
a uma microcentral termelétrica.
Entretanto, por ora nem todos os produtores integrados
instalaram os equipamentos para a utilização do biogás em suas propriedades,
principalmente em função dos custos que podem chegar a R$ 800,00. Da mesma
forma, ainda não comercializam assim o excedente para a Companhia de Energia do
Estado.
Biodigestores para tratar esgoto sanitário das cidades
O biodigestor é uma tecnologia simples e de baixo custo para
tratar dejetos orgânicos, incluindo esgoto. Para Moacir Araújo, especialista em engenharia
hidráulica e saneamento, o Brasil erra ao buscar uma solução de universalização
do tratamento do esgoto através da construção de grandes estações
de tratamento e redes coletoras. Para ele, isto é um equívoco, já que o custo é extremamente elevado, estimado
em R$ 150 bilhões, não previstos, por enquanto, no orçamento público.Segundo ele afirma em entrevista
ao site de jornalismo e sustentabilidade Envolverde (http://envolverde.com.br/sociedade/brasil-sociedade/biodigestor-pode-solucionar-parte-do-problema-de-saneamento-basico-no-brasil),
“para um país onde 95% dos municípios são pequenos, com população de até cem
mil habitantes, existem alternativas melhores. Uma delas, que eu chamo de
ganha-ganha, é o biodigestor.”
De acordo com ele, a tecnologia conta com o apoio do
Ministério das Cidades, mas não há levantamentos sobre quais e quantos
municípios adotam esse tipo de solução. Moacir Araújo conta ainda que as
pesquisas desenvolvidas, por exemplo, pela Escola de Engenharia da USP de São
Carlos, e por algumas empresas da área, recebem reconhecimento internacional.
“As pesquisas e as aplicações têm demonstrado tecnologias eficazes para
tratamento do esgoto sanitário por meio do biodigestor e, ainda, no fim do
processo, com a oportunidade de gerar energia”, explica Araújo.
Uma alternativa para o uso do biogás resultante do
tratamento de efluentes urbanos é o seu emprego para a secagem do próprio lodo
oriundo do tratamento. O gás proveniente da operação de um digestor tipo UASB (sigla
inglesa que denomina os reatores anaeróbios de fluxo ascendente através de uma
manta de lodo), seria suficiente para a secagem do excesso de lodo produzido
pelo mesmo, conforme demonstram vários estudos de viabilidade. O resultado
seriam plantas de tratamento mais compactas: um reator como estes, de fluxo rápido
e retenção eficiente dos agentes biológicos, proporciona bons resultados na
redução da carga orgânica com tempos de detenção muito curtos, necessitando de
área útil bastante inferior à dos modelos horizontais; o emprego do metano
evitaria o dispêndio de espaço com leitos de secagem convencionais.
Empresas
Há, no mercado, empresas atuando na implantação de kits prontos de pequenos
biodigestores, verticais ou de lona, para pequenas propriedades e, também na
construção de biodigestores gigantes, utilizando-se da
mesma técnica. As facilidades de financiamento através de programas como
o Pronaf Eco e Programa ABC garantem de 100% do valor
financiado com prazos e carência atrativos.
Desta forma encontram-se a venda biodigestores de 10 metros cúbicos e menos de 10 metros quadrados, com produção média de 3 a 5m³ de biogás por dia ou 5 botijões de 13 quilos por mês, e, com uma expectativa de produção de biofertilizantes na faixa de 60 quilos de uréia, 60 quilos de super triplo e 25 quilos de cloreto de potássio. É um sistema destinado a pequenas propriedades e atende cerca de 50 suínos com peso médio de 70 quilos ou 10 bovinos com peso médio de 400 quilos.
Desta forma encontram-se a venda biodigestores de 10 metros cúbicos e menos de 10 metros quadrados, com produção média de 3 a 5m³ de biogás por dia ou 5 botijões de 13 quilos por mês, e, com uma expectativa de produção de biofertilizantes na faixa de 60 quilos de uréia, 60 quilos de super triplo e 25 quilos de cloreto de potássio. É um sistema destinado a pequenas propriedades e atende cerca de 50 suínos com peso médio de 70 quilos ou 10 bovinos com peso médio de 400 quilos.
O kit básico para instalação e uso do biogás fornecido
por uma destas indústrias é composto do kit de instalação (tubulação de biogás,
conexões e manômetro), medidor de produção de biogás, bomba de sucção do
biogás, purificador de 4 Litros, fogão de duas bocas especial para biogás,
balão de armazenamento do biogás de 2 m³ e biodigestor de 10 m³.
Há também os gigantes, como os construídos por uma
empresa do Oeste Paranaense que projeta e executa obras
na área de tratamento biológico de efluentes industriais, com objetivo
principal de recuperar biogás para geração de energia térmica e elétrica. Aí a produção de biogás é
exponencialmente maior. Para se ter uma ideia do
número de indústrias que tem investido neste setor a empresa, que não é única
na área, tem cerca de duas dezenas de obras previstas para 2013.
Tido como um dos maiores do mundo, o biodigestor construído pela empresa no município de Guaíra, também no oeste do Paraná, tem cerca de 10 mil metros quadrados e está proporcionando uma redução de emissão de aproximada de 30.000 toneladas de CO2 equivalente e redução em 80% no consumo de lenha.
“É claro que nem todas as obras são
deste porte. Há os biodigestores construídos em granjas, por exemplo, cuja
capacidade pode girar em torno de 1.200m³”, esclarece Eduardo Ferreira,
engenheiro agrônomo e sócio da empresa.
Uma experiência modelo
Algumas iniciativas, como o Condomínio de Agroenergia para Agricultura
Familiar da Microbacia do Rio Ajuricaba, foram implantados com apoio oficial de
empresas de geração de energia, como a Itaipu Binacional e sua Plataforma de
Energias Renováveis. A localidade de Linha Ajuricaba fica no interior do
município de Marechal Cândido Rondon, oeste paranaense. É composta quase que
totalmente por pequenas propriedades, a maioria produtoras de leite e fica às
margens do reservatório da usina de Itapu.
Os passivos ambientais decorrentes de cinco décadas de uso
da terra e nenhuma preocupação com os dejetos das atividades agropecuárias
começaram a ser corrigidos por volta de 2005 dentro das atividades propostas
pelas iniciativas previstas pela Itaipu Binacional para a Bacia do Paraná III,
através do Programa Cultivando Água Boa.
Em 2009 iniciou-se a implantação do Condomínio de Agroenergia,
nos moldes dos desenvolvidos na Alemanha, através de uma parceria entre o
Instituto Paranaense de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-PR),
Companhia Paranaense de Energia (Copel) Prefeitura Municipal de Marechal
Cândido Rondon, Embrapa, Movimento Nacional dos Pequenos Agricultores (MPA),
Instituto de Tecnologia Aplicada e Inovação (ITAI) e a Fundação Parque
Tecnológico Itaipu (FPTI) e os próprios produtores.
O objetivo do projeto foi implantar uma referência
concreta para a agroenergia na agricultura familiar e desenvolver os critérios
para sua sustentação econômica, ambiental, social e energética. O
projeto contempla a instalação de 34 biodigestores e 22 km de gasodutos ligados
a uma microcentral termelétrica.
Entretanto, por ora nem todos os produtores integrados
instalaram os equipamentos para a utilização do biogás em suas propriedades,
principalmente em função dos custos que podem chegar a R$ 800,00. Da mesma
forma, ainda não comercializam assim o excedente para a Companhia de Energia do
Estado.
Biodigestores para tratar esgoto sanitário das cidades
O biodigestor é uma tecnologia simples e de baixo custo para
tratar dejetos orgânicos, incluindo esgoto. Para Moacir Araújo, especialista em engenharia
hidráulica e saneamento, o Brasil erra ao buscar uma solução de universalização
do tratamento do esgoto através da construção de grandes estações
de tratamento e redes coletoras. Para ele, isto é um equívoco, já que o custo é extremamente elevado, estimado
em R$ 150 bilhões, não previstos, por enquanto, no orçamento público.Segundo ele afirma em entrevista
ao site de jornalismo e sustentabilidade Envolverde (http://envolverde.com.br/sociedade/brasil-sociedade/biodigestor-pode-solucionar-parte-do-problema-de-saneamento-basico-no-brasil),
“para um país onde 95% dos municípios são pequenos, com população de até cem
mil habitantes, existem alternativas melhores. Uma delas, que eu chamo de
ganha-ganha, é o biodigestor.”
De acordo com ele, a tecnologia conta com o apoio do
Ministério das Cidades, mas não há levantamentos sobre quais e quantos
municípios adotam esse tipo de solução. Moacir Araújo conta ainda que as
pesquisas desenvolvidas, por exemplo, pela Escola de Engenharia da USP de São
Carlos, e por algumas empresas da área, recebem reconhecimento internacional.
“As pesquisas e as aplicações têm demonstrado tecnologias eficazes para
tratamento do esgoto sanitário por meio do biodigestor e, ainda, no fim do
processo, com a oportunidade de gerar energia”, explica Araújo.
Uma alternativa para o uso do biogás resultante do
tratamento de efluentes urbanos é o seu emprego para a secagem do próprio lodo
oriundo do tratamento. O gás proveniente da operação de um digestor tipo UASB (sigla
inglesa que denomina os reatores anaeróbios de fluxo ascendente através de uma
manta de lodo), seria suficiente para a secagem do excesso de lodo produzido
pelo mesmo, conforme demonstram vários estudos de viabilidade. O resultado
seriam plantas de tratamento mais compactas: um reator como estes, de fluxo rápido
e retenção eficiente dos agentes biológicos, proporciona bons resultados na
redução da carga orgânica com tempos de detenção muito curtos, necessitando de
área útil bastante inferior à dos modelos horizontais; o emprego do metano
evitaria o dispêndio de espaço com leitos de secagem convencionais.
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